segunda-feira, janeiro 15, 2018

Dolores



Não sei se alguma vez me senti tão triste pela morte de uma pessoa que nunca conheci pessoalmente. Mas hoje me sinto como se tivessem arrancado um pedaço da minha vida; esse pedaço era Dolores O'Riordan, uma voz com quem cresci e que me ajudou a me tornar a pessoa que sou, me deu um pedaço do tecido com o qual costurei a vida.

Ela era jovem, e subitamente não é mais. Estancou no tempo, está morta e deixou três filhos além de uma legião de fãs, entre os quais um bom tanto de gente deve estar triste e sentindo órfão como estou.

Eu sempre desprezei muito o sentimento de idolatria e tietagem. Não gosto de ficar investigando detalhes da vida de pessoas públicas que admiro; nunca vi sentido em um autógrafo. E talvez por estranhar essa bizarra sensação de proximidade com as “estrelas” da indústria cultural, algo que chega a níveis doentios na tal “sociedade do espetáculo”, eu acho estranho me sentir assim.

Nunca troquei uma palavra com Dolores, ela nunca soube da minha existência. E, no entanto, sua voz me consolou em momentos tristes, difíceis, de ódio mais do que a voz de qualquer pessoa que eu ame. Suas músicas foram a trilha sonora de momentos felizes; de desilusões amorosas. Da minha adolescência e da minha vida adulta. Uma presença constante, desde meus doze anos.

Eu também tive momentos de afastamento, quando gostei menos dos “novos” discos, primeiro o
“Bury the hatchet” em 99 (quando eu tinha quinze anos e Cranberries já era uma “velha banda” na minha curta vida) e depois ainda mais o “Wake up and smell the coffe”. Depois, com o tempo fiz as pazes e aprendi a gostar das novas músicas, que foram encontrando seus significados nas minhas experiências. Os próprios membros do Cranberries tiveram seu “tempo”, dissolvendo o grupo entre 2003 e 2009. Tal como eles, não aguentei ficar muito tempo longe da banda.

Pouquíssimos músicos ressoaram tanto e tão significativamente nos meus ouvidos. Gosto de muitas músicas diferentes, mas consigo facilmente destacar quatro bandas as quais me apeguei de um jeito muito mais intenso: Queen, Cranberries, Garbage e Sleater Kinney. As músicas as quais sempre recorro, como uma volta para casa. Como um abraço de um amigo quando você precisa.

As causas da morte de Dolores não foram divulgadas. Mas certamente foram terríveis e brutais, para tirar uma vida tão jovem e florescente, aos 46 anos, num quarto de hotel durante uma viagem para gravações. Como é inevitável, eu, como qualquer pessoa, me pergunto. A maldita palavra ressoa como uma pergunta na minha cabeça quase ao mesmo tempo em que recebo o baque pesado e inesperado da notícia de sua morte. Suicídio? Com fama, talento, fortuna e filhos que eram “a sua salvação”, como ela mesmo dizia, Dolores teve sua cota de merda desse mundo asqueroso. Abuso sexual na infância que levou a transtornos alimentares, um “colapso” e, depois, um diagnóstico – mais um número da nossa lista – de transtorno bipolar. Em 2014 e 2016 foi acusada de agressão em supostos ataques maníacos.

Não sei nada sobre sua vida pessoal, nem quero na verdade, transformar isso em objeto de especulação. Mas sei que a morte de Dolores, um dos maiores talentos musicais de sua geração e em minha opinião a mais linda voz dela, muito provavelmente, é mais uma dos infindáveis crimes dessa sociedade doente. Não são coisas "casuais" ou infortúnios que lhe ocorreram. São crimes bárbaros, são a marca desse mundo. Ela sofreu a brutalidade que é reservada às mulheres. Sua mente, adoecida, foi submetida aos procedimentos monstruosos que criamos. A bizarra forma como a arte é explorada como uma mercadoria de alta lucratividade, e os artistas muitas vezes são destruídos por essa engrenagem da indústria cultural, também cobrou um preço alto de Dolores. Ela disse que, no auge da fama do Cranberries, ela se sentia “realmente doente e estragada... eu me sentia como um fantoche, um objeto." De uma forma ou de outra, ela, como tantos, foi sendo envenenada de uma forma que ninguém nunca mais deveria ser. E eu lamento, por tudo isso, ainda mais sua tristíssima morte. 


Once you ruled my mind,
I thought you'd always be there.
And I'll always hold on to your face.
But everything changes in time,
And the answers are not always fair.
And I hope you've gone to a better place.

Cordell,
Time will tell,
They say that you've passed away,
And I hope you've gone to a better place.
Time will tell,
Time will tell,
They say that you've passed away,
And I know that you've gone to a better place.
Cordell [x7]

Your lover and baby will cry,
But your presence will always remain,
Is this how it was meant to be?
You meant something more to me,
That what many people will see,
And to hell with the endless dream.

Cordell,
Time will tell,
They say that you've passed away,
And I hope you've gone to a better place.
Time will tell,
Time will tell,
We all will depart and decay,
And we all will return to a better place.
Cordell [x7]

Era uma vez, você reinava em minha mente,

Eu pensei que você sempre estaria ali.

E eu sempre lembrarei de seu rosto.

Mas tudo muda com o tempo,

E as respostas não são sempre justas.

E eu espero que você tenha ido para um lugar melhor.



Cordell,
O tempo dirá,

Disseram que você morreu,

E eu espero que você tenha ido para um lugar melhor.

O tempo dirá,

O tempo dirá,

Disseram que você morreu,

E eu sei que você foi para um lugar melhor.

Cordell [x7]




O seu amante e seu filho irão chorar,

Mas sua presença permanecerá para sempre,

Era assim que deveria ser?

Você significava algo a mais para mim,

Mais do que muitas pessoas verão,

E para o inferno com o sonho sem fim.




Cordell,
O tempo dirá,

Disseram que você morreu,

E eu espero que você tenha ido para um lugar melhor.

O tempo dirá,

O tempo dirá,

Todos nós iremos partir e decair,

E nós vamos todos retornar para um lugar melhor.

Cordell [x7]

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