sexta-feira, agosto 29, 2014

Porque devemos apoiar a luta dos palestinos

Publicado originalmente no site da Liga Estratégia Revolucionária



Crianças israelenses escrevem mensagens como "com amor, de Israel" nos mísseis que serão lançados sobre Gaza.

1.902 mortos, 10.000 feridos. A maior parte civis e, destes, uma grande parcela de crianças. Esses são os números gerados pelos ataques de Israel aos palestinos na Faixa de Gaza. Quando você estiver lendo esse texto, esses números provavelmente já estarão desatualizados, pois o número cresce a cada hora.

Muito se lê e se ouve dizendo que Israel estaria exercendo seu “direito à legítima defesa”. Estaria contra-atacando para se proteger dos ataques do grupo Hamas, que alegam ser um grupo terrorista. Vejamos, em primeiro lugar, os “ataques” que Israel alega ter sofrido recentemente: seus bombardeios sobre Gaza se iniciaram após o sequestro e assassinato de três jovens israelenses; o governo de Israel afirmou ser responsabilidade do Hamas, mas não apresentou nenhuma prova disso, e o Hamas diz não ter participação nesse episódio. Isso, de acordo com o governo liderado pelo direitista Benjamin Netanyahu, do partido Likud, justificaria a destruição massiva que Israel tem levado adiante, destruindo escolas, hospitais, casas, matando dezenas de crianças e atingindo centenas de alvos não militares. Isso é a mais evidente demonstração do cinismo das declarações de que Israel está “se defendendo”.

Uma Palestina onde árabes, judeus e cristãos viviam em paz

Contudo, a questão é muito mais profunda. Para entendê-la, é necessário conhecer a história da Palestina e da criação do Estado de Israel. Nos limites desse artigo é impossível desenvolver todos os aspectos, mas queremos apontar o essencial. Já no século XIX, quando a região da Palestina fazia parte do Império Otomano, ali convivia pacificamente uma população de variada origem étnica e religiosa. A maioria eram árabes e muçulmanos, mas ao lado desses os cristãos e judeus coexistiam harmoniosamente.

Em muitas regiões do mundo os governos passaram a implementar políticas anti-semitas, ou seja, de perseguição aos judeus sob as mais variadas formas: desde leis que os segregavam, bairros e escolas separadas até o massacre físico. Um dos lugares em que essa política foi levada adiante de forma mais intensa foi na Rússia, onde foi aplicada pelo governo da monarquia (os tzares). Era uma política de Estado fazer os chamados “pogroms”, que eram massacres contra os judeus. Ali, como em toda a parte, os judeus era proibidos de cultivar a terra. Havia, no entanto, um povo que não os perseguia e não implementava essa proibição: o povo árabe. E, por isso mesmo, muitos e muitos judeus passaram a imigrar para a Palestina, onde podiam viver sem serem segregados.

O sionismo criado sob as asas do imperialismo

No fim do século XIX, Theodor Herzl fundou o movimento sionista, que defendia a criação de um Estado judaico, que a seu ver era a forma de acabar com a perseguição aos judeus. Esse movimento, inicialmente bastante minoritário entre os judeus e inexpressivo politicamente, ganhou o apoio do imperialismo britânico, que, após o fim da Primeira Guerra Mundial e o desmantelamento do Império Otomano, passou a gerir a Palestina como seu “protetorado”, a partir da divisão do espólio de guerra entre os países imperialistas.

Apoiou a imigração massiva de judeus para a palestina, mas não por querer “ajudar os judeus”, que já viviam ali tranquilamente, mas sim por querer criar um pólo sob sua influência em uma região estratégica. Como fim daSegunda Guerra e o ascenso do imperialismo americano, o movimento sionista troca de “padrinho” e se filia aos EUA, que, com o mesmo interesse militar, político e econômico, apoia a criação de Israel. Em 1948, valendo-se do trágico massacre aos judeus feito por Hitler na guerra, consegue difundir a ideologia da criação de Israel.

O sionismo tinha um lema para a Palestina: “Uma terra sem povo para um povo sem terra”. Só que a Palestina não era uma terra sem povo: como dissemos, ali já era um local habitado por muitos povos, e, majoritariamente, os árabes. Quando a ONU aprova a resolução da criação do Estado de Israel estão dando o sinal verde para a criminosa política que já há algumas décadas era incentivada por EUA e Inglaterra: a expulsão dos árabes palestinos de suas casas. Para consagrar a criação de Israel, uma mílicia organizada pelo sionista Bem Gurion leva adiante a expulsão e o massacre de dezenas de aldeias, entre os quais o mais célebre é o de Dir Yassin, no qual 250 pessoas, incluindo mulheres e crianças, foram assassinadas.

Israel: um estado religioso e racista fundado no militarismo e expansionismo

Esse foi o método pelo qual Israel continuou se expandindo desde então: em dezenas de massacres, em guerras como a dos seis dias em 1967, foram tomando cada vez mais territórios às custas de milhares de mortes e milhões de exilados. Hoje, os palestinos exilados, que não têm direito de voltar às suas casas e estão espalhados pelo mundo, inclusive pelo Brasil, são cerca de 8 milhões. Isso só pode ser feito criando Israel como um Estado religioso, no qual os palestinos são discriminados por cerca de 30 leis, tal como ocorria com os judeus na Rússia tzarista.

Mais do que isso, para essa política expansionista se criou a ideia de “cidadão-soldado”, num país em que cerca de 20% do PIB vai para financiar o exército e todos os homens servem quatro anos nas forças armadas, e as mulheres três. Isso, somado à intensa propaganda sionista, deixou marcas profundas na ideologia do povo israelense: não é a toa que hoje vemos fenômenos como o “cinema de Sderot”, em que israelenses assistiam em cadeiras de praia e aplaudindo os bombardeios sobre Gaza, ou as crianças que escreviam “mensagens de amor” nas bombas e mísseis que eram jogados sobre o território. Cria-se uma ideologia fascista, na qual os árabes são vistos como “sub-humanos” para se justificar seu massacre. Os israelenses que resiste a esse processo de fascistização, como os jovens que se recusam a servir no exército ou alguns intelectuais, são completamente marginalizados em seu país como “traidores”.

Como resolver a questão?

Tudo isso é fundamental para entendermos que não é possível ver a questão como de “dois lados agressores” que estão, ambos, errados. Nem que Israel tem direito à defesa, ou que é necessário criar dois Estados, um palestino e um judaico. A base que sustenta Israel desde sua criação é uma ideologia imperialista, um expansionismo fundado numa ideologia racista de que os judeus são “o povo eleito” e por isso têm mais direitos do que os palestinos a existir, um Estado religioso e militarizado até a medula. Os próprios judeus ortodoxos dizem não concordar a existência de Israel, e têm protagonizado atos, ao lado de outras dezenas de manifestações ao redor do mundo que reuniram centenas de milhares, contra esse massacre.

A única forma de garantir uma existência pacífica para judeus e árabes na Palestina é a criação de um Estado único, uma Palestina que não seja racista. Para isso, no entanto, é fundamental se libertar da dominação do imperialismo, que tem ali um ponto de apoio fundamental para sua política de dominação no oriente médio. Por isso, somente a classe trabalhadora pode dar uma resposta a essa situação, os trabalhadores judeus e árabes podem criar um país que rume ao socialismo, se unificando com os trabalhadores de todos os países árabes na região para a criação de uma União de Estados Árabes Socialistas. Isso está em oposição à existência de Israel, mas também à solução igualmente reacionária proposta por Hamas, de um Estado árabe teocrático que voltaria seu racismo e discriminação contra os judeus. A criação de um Estado operário e socialista só pode se dar pela via da união dos trabalhadores árabes e judeus, fazendo, conjuntamente, uma revolução contra suas burguesias, que são as verdadeiras interessadas em que o massacre se perpetue.

E o Brasil com isso?

É criminoso que qualquer pessoa no mundo fique calada diante desse massacre, que não é de hoje, mas que ocorre há mais de sessenta anos. A diplomacia brasileira, diante disso, veio a público dizer que os ataques de Israel eram “desproporcionais”. O primeiro problema com essa afirmação é que não há nenhum tipo de ataque “proporcional” contra o povo palestino: toda agressão feita por Israel é um crime contra a humanidade.

Em segundo lugar, a postura “independente” do Brasil foi desmentida logo que a diplomacia israelense fez suas declarações asquerosas de que “o Brasil é um anão diplomático” e de que “desproporcional é sete a um”. Ogoverno brasileiro apressou-se em declarar que “reconhece o direito de defesa de Israel”, mostrando que é, sim, conivente com o massacre dos palestinos.



Mas é muito pior: o governo brasileiro é o quinto maior importador de armas de Israel no mundo. Essas armas são usadas para reprimir nas favelas. A polícia e exército brasileiro também recebem treinamento do exército de Israel. Esse é o nível de cumplicidade entre o governo brasileiro e o governo israelense. É necessário irmos às ruas, como ocorreram nos três atos já realizados em São Paulo, massificando cada vez mais nossas mobilizações para exigir que se encerre qualquer relação diplomática com Israel, e que acabe todo tipo de acordo militar entre os dois países.