sexta-feira, dezembro 31, 2004

Caralho, que ano...
O conto de natal vai ter que sair, é questão de honra. Mesmo que não seja pro natal e nem pra este ano. Já comecei a escrever, mas a greve tá tirando o atraso até agora em cima das minhas costas. Falta de computador em casa, ainda não consegui me adaptar a tantas mudanças tão rápido. Falta emprego, falta tempo, falta glamour e um monte de coisa. Mas dá pra tirar de letra, eu sei que dá.
Daí eu vou colocar o conto aqui em breve. Assim que terminar meus dois trabalhos que tenho que entregar no dia 3 e escrever ele em um computador generosamente emprestado (talvez o do Bueno, onde eu escrevo este post e que vai me ajudar a digitar os trabalhos).
Férias...fôlego pra 2005, que provavelmente vai ser muito mais foda que 2004, que por sua vez foi muito mais foda que 2003, que por sua vez foi muito mais foda que 2002...

domingo, dezembro 12, 2004

Glamour x Banalidade.
A vida segue...
Changeling nestas férias, isto é uma certeza.
Se preparem meus playerzinhos preferidos.

P.S. pros meus amiguinhos: a gente ainda se vê por aí. ;-)
P.S. pra Juju: Eu acho que vou fazer russo com vc...

sexta-feira, novembro 05, 2004

Eu sempre achei isto:
Ser criança é muito mais divertido.

Amanhã, sábado, tem uma festa na minha casa de arrecadação de fundos para campanha da chapa para DCE que a gente apóia. Cinco reais para entrar e qualquer bebida é um real. Eu ficaria feliz se alguns amiguinhos de fora da usp estivessem por lá.
Meu cérebro é um gerador de crises.

segunda-feira, outubro 25, 2004

Where is my mind?

É emgraçado ficar vendo e vivendo as coisas mudando e remudando e tremudando.
Minha vida vao bem, fora problemas pontuais de grande importância que devem ser resolvidos com urgência.
Sabe, é triste como não ter internet e telefone ceifa uma parcela significativa e importante da minha vida social. Mas eu vou dar um jeito de voltar a falar com meus amigos direitinho.
E quem quiser sempre pode passar na minha nova casa pra me visitar.
(Acho que meu grande problema nesta vida é não conseguir ser comedido com as coisas e saber concilicar. Será que é uma limitação intelectual não conseguir se dedicar decentemente a mais de um aspecto da sua vida simultaneamente?)
Saudades são uma coceira engraçada na cabeça.

segunda-feira, outubro 18, 2004

Agora tenho pouco tempo pra pensar.
Mas se arranjo, e penso, me sinto vazio por dentro e cheio por fora.
Acho que o que me angustia é não conseguir me encontrar.
E se procuro tanto e não me encontro, deve ser porque não há o que encontrar.
Portanto, eu não existo.
Ou estou procurando do jeito errado no lugar errado.

domingo, agosto 29, 2004

Quando você abre os olhos e acorda, tudo deveria ser como a vida que você deixou na cama ontem. Quando você acorda, tudo deveria ser um retorno, mais um episódio do gigantesco contínuo.
Você acorda, desperta pra um divórcio.
Antes, com os olhos fechados, você finalmente era um só. Seja lá onde estivesse, você era aquilo, por mais estranho e desconexo que fosse. E quanto mais desperto você se encontra, mais você passa a se perder dentro de tudo aquilo. Aquilo do qual você acordou, aquilo para o qual você acordou, aquilo para o qual você continua dormindo.
Quando você acorda, é um nascimento, é uma morte.
Eu lembro precisamente do rosto que agora há pouco era uma verdade. Ele é meu, ele é tudo, ele é uma invenção imprecisa que não existe. Eu era um passado. Mas agora o que eu sou?
Eu não sou estas linhas tortas, eu não sou uma batida de carro, eu não sou um coquetel de drogas, eu não sou palavras e nem gestos, eu não sou você, eu não sou eu.
Eu não sou um sonho, e nem um despertar.
A vida é um delírio onírico, uma realidade palpável, um algo intangível e concreto como uma parede de granito.
Eu já não sei mais falar, e agora não sei mais se isto importa. Eu já não sei mais atribuir valor às coisas e graduá-las, eu não sei mais ordenar o caos. E eu já não sei se isto importa.
E eu já não sei se você importa.
Ser feliz é o que? E faz parte disto?
Cadernos podem ser preenchidos de tantas maneiras.

- I guess I could be pretty pissed off about what happened to me... but it's hard to stay mad, when there's so much beauty in the world. Sometimes I feel like I'm seeing it all at once, and it's too much, my heart fills up like a balloon that's about to burst...And then I remember to relax, and stop trying to hold on to it, and then it flows through me like rain and I can't feel anything but gratitude for every single moment of my stupid little life...You have no idea what I'm talking about, I'm sure... but don't worry...You will someday.
-Lester, American Beauty
Até que dá pra se divertir um bocado nesta vidinha pacata.
E a literatura tá sempre aí, que nem aqueles amigos que você fica muito tempo sem falar, mas que sabe que quando precisar vai poder contar com eles pra qualquer coisa.

sexta-feira, agosto 27, 2004

http://kevan.org/brain.cgi?harlegraaargh!

sexta-feira, agosto 13, 2004

Lá na minha casa eu não estou conseguindo acessar pra postar no meu blog.
Estou no DCE postando.
Ando procurando tempo pra fazer tudo que eu devia e/ou queria fazer.
Ando procurando meios termos entre eu e eu.
Tenho saudades de muitas coisas, mas eu sempre fui assim mesmo.

sexta-feira, julho 30, 2004

O que você procurava em mim e no mundo?
Se era um espelho, você se deu mal.

domingo, julho 25, 2004

Às vezes a gente tem que se enfrentar.
Eu olho pra você, como se fosse um espelho ou um retrato antigo. Uma foto de criança com cabelo engomadinho e roupa bordada com firulas, que a mamãe colocou pra ficar bem bonito. Eu olho pra você e eu posso ver um monte de coisas.
Aí eu me pergunto.
O que você vê quando olha pra mim?
O que acontece quando você mergulha e fica lá embaixo muito tempo?
Quando foi a última vez que você me enfrentou?
Quando foi a última vez que você se enfrentou?
Em que mundo você vive e em que mundo você quer viver?
Não é bom ter uma alma com cãimbras.
Exercite-se, exercite-me.
Abraços sinceros.

segunda-feira, julho 05, 2004

Estive fora de SP neste fim de semana, mas estou de volta.
Vou de novo pra assembléia, a partir de hoje à noite.
Caso alguém da USP ou alguém que se importe minimamente com a greve apareça por aqui, amanhã vai ter o ato mais importante da greve. Apareçam na assembléia em qualquer momento, vai ter votação da LDO e é MUITO importante termos muitas pessoas por lá.
Se vcs quiserem ir hoje mesmo e se juntar ao acampamento, são bem vindos.
Até mais.

terça-feira, junho 29, 2004

A partir desta noite estarei acampado em frente à assembléia legislativa. Aqueles que não tiverem mais o que fazer e quiserem apoiar este importante ato da nossa greve serão muito bem vindos no acampamento, onde haverá diversão infinita para todos.
Até mais.
Beijos.

segunda-feira, junho 21, 2004

Às vezes as coisas mudam.
Às vezes, parece que as coisas mudaram mas é só porque as pessoas nunca enxergaram que no fundo elas já eram daquele jeito.
As pessoas são demasiadamente presas aos seus pontos de vista e preconceitos. As pessoas são críticas de menos, egoístas de menos e muitíssimo apressadas em julgar as ações e pensamentos dos outros. Nada contra, é necessário julgar os outros em um momento ou outro. Mas se olha no espelho antes de dizer que alguém é imbecil.
Ah, eu estou bem sim Thaís. Bem demais até, tomei um spray de pimenta na cara e uns empurrões com cassetete, mas isto não me fez mal.
Mas o que importa agora é que não é o momento pra escrever. Fora o fato de que eu preciso urgentemente arranjar um word. Alguém tem?

segunda-feira, junho 07, 2004

The Good Life

When I look in the mirror, I can't believe what I see
Tell me, who's that funky dude, staring back at me?
Broken, beaten down can't even get around
Without an old-man cane, I fall and hit the ground
Shivering in the cold, I'm bitter and alone

Excuse the bitchin', I shouldn't complain
I should have no feeling, 'cuz feeling is pain
As everything I need, is denied me
And everything i want, is taken away from me
But who do I got to blame? Nobody but me

…And I don't wanna be an old man anymore
It's been a year or two since I was out on the floor
Shakin' booty, makin' sweet love all the night
It's time I got back to the Good Life
It's time i got back, it's time i got back
And I don't even know how I got off the track
I wanna go back…Yeah!

Screw this crap, I've had it! I ain't no Mr. Cool
I'm a pig, I'm a dog, so 'scuse me if I drool
I ain't gonna hurt nobody, ain't gonna 'cause a scene
I just need to admit that I want sugar in my tea
Hear me? Hear me? I want sugar in my tea!

…And I don't wanna be an old man anymore
It's been a year or two since I was out on the floor
Shakin' booty, makin' sweet love all the night
It's time I got back to the Good Life
It's time i got back, it's time i got back
And I don't even know how I got off the track
I wanna go back…Yeah!

I want to go back, I want to go back
And I don't even know how I got off the track
It's time i got back, it's time i got back
And I don't even know how I got off the track
I want to go back…Yeah!

…And I don't wanna be an old man anymore
It's been a year or two since I was out on the floor
Shakin' booty, makin' sweet love all the night
It's time I got back to the Good Life
It's time i got back, it's time i got back
and I don't even know how I got off the track
I wanna go back…Yeah!

terça-feira, junho 01, 2004

Eu tive uma idéia, provavelmente uma das mais práticas e certeiras que já passou pela minha cabeça.
Eu devia tatuar "OTÁRIO" bem grande na minha testa, assim quando eu acordasse e olhasse no espelho eu não correria mais o risco de esquecer esta informação vital.
Mas eu não vou colocar minha idéia em prática.
Abstinência de vida. Maldito vício.
Dormindo. É o único jeito de escapar. Não de verdade, porque de verdade não se escapa. E eu já sei disto, faz tempo, por mais que relute. Quando se está dormindo apenas os sonhos atormentam. E os pesadelos. Mas não faz diferença, não dá mais pra dizer qual é qual. Não existe mais esta distinção nos mundos que me acolhem quando eu fecho os olhos pra fugir. Pra fugir de tudo e continuo aqui, esperando acordar. Não dá pra dormir pra sempre, e eu acordo. Uma, duas, dez vezes. Eu acordo pra sempre e vejo que nos meus sonhos tudo é ruim também. Tudo é ruim de qualquer jeito, e eu tento fazer de tudo pra não conseguir pensar em nada. Mas não pensar é impossível, não sentir é impossível. Faz parte de ser. E é por isto que eu não queria ser. Eu queria não ser. Só que eu sou e continuo sendo e mesmo nos meus sonhos eu sou, e sinto e penso. E tudo me arrasta de volta sempre pro mesmo lugar. Uma âncora me prende, mas o motor continua correndo. Tudo se esgota, tudo me esgota. Nada esgota os meus sonhos. As lágrimas são a prova de que estou vivo. Acho que as lágrimas são a única coisa que diferencia os sonhos da vida. Quando acabam os sonhos, vêm as lágrimas. Antes de começar os sonhos, tem as lágrimas. Elas secam, mas vêm outras. Não acabam.
Os sonhos sempre dependem de quem os cria. Se alguém não os sonhasse, não seriam sonhos, não seriam nada. Mas e se existisse um sonho sem ninguém para sonhá-lo? É a solidão mais triste, que um sonho tenha que correr atrás de seu sonhador. Isto não existe. Mas ainda assim chora.
Abstinência de verdade, crenças, esperanças. Malditos vícios. Um viciado faz de tudo para conseguir suas drogas. A vida é triste correndo atrás de vícios.

segunda-feira, maio 31, 2004

Never There

I need your arms around me, I need to feel your touch
I need your understanding, I need your love so much
You tell me that you love me so, you tell me that you care
But when I need you baby, you’re never there

On the phone long, long distance
Always through such strong resistance
First you say you’re too busy
I wonder if you even miss me

Never there
You’re never there
You’re never, ever, ever, ever there

A golden bird that flies away, a candle’s fickle flame
To think I held you yesterday, your love was just a game
A golden bird that flies away, a candle’s fickle flame
To think I held you yesterday, your love was just a game

You tell me that you love me so, you tell me that you care
But when I need you baby
Take the time to get to know me
If you want me why can’t you just show me
We’re always on this roller coaster
If you want me why can’t you get closer?

Never there
You’re never there
You’re never ever ever ever there

quinta-feira, maio 27, 2004

Thru The Eyes Of Ruby Lyrics

Wrap me in always, and drag me in with maybes
Your innocence is treasure, your innocence is death
Your innocence is all I have
Breathing underwater, and living under glass
And if you spin your love around
The secrets of your dreams
You may find your love is gone
And is not quite what it seemed
To appear to disappear
Beneath all your darkest fears
I believe in never, I believe in all the way
But belief is not to notice, belief is just some faith
And faith can't help you to escape
And with this ring I wed thee true
And with this ring I wed thee now
And with this ring I play so dead
But no one's asking for the truth, so let me tell you
If you spin your love around
The secrets of your dreams
You may find your love is gone
And is not quite what it seemed
To appear to disappear
Beneath all your darkest fears
To the revelations of fresh faced youth
No one will come to save you
So speak your peace in the murmurs drawn
But youth is wasted on the young
Your strength is my weakness, your weakness my hate
My love for you just can't explain
Why we're forever frozen, forever beautiful,
Forever lost inside ourselves
The night has come to hold us young

quarta-feira, maio 26, 2004

Inúmeras vezes levantei. Senti minhas pernas se esticando, meus músculos contraindo, minhas articulações rangendo e estalando, minha configuração espacial se transformando no meu cérebro, minha freqüência respiratória e cardíaca se alterando. Contei, pra ter certeza. Levantar era um esforço, como levantar o mundo nas costas, mas tudo confirmava: vinte e cinco movimentos respiratórios por minuto, cento e vinte batimentos cardíacos. Tendões esticados, tensos, retesando-se a todo custo. Depois a dor, a fadiga, câimbras, tremedeiras. O suor, escorrendo lentamente, tentando aplacar o calor que toma o corpo, cada vez mais quente pelo esforço. A planta do pé firme, colada ao chão duro. A visão turva, embaçando, o mal-estar, desconforto, enjôo, ânsias. Glicemia baixando, energia se consumindo, dor.

Mas quando abri os olhos, não tinha levantado.

terça-feira, maio 25, 2004

Às vezes os dias são lutas.
Acordamos como quem não quer, abrimos os olhos e levantamos como quem não deve. Contra nós mesmos nos colocamos de pé. Como quem não quer ver este mundo que parece feito para nos maltratar. Quero me agarrar nos meus sonhos, tão lindos, tão violentamente destroçados pelo ranço da realidade. Mas é tarde demais, ele gruda, ele infecta e contamina. Estamos acordados e vivendo, e não há muito que se possa fazer a respeito. Os sonhos que pareciam tão bons, agora parecem servir apenas para explicitar, esfregar na nossa cara o desgosto de cada passo, de cada momento nesta prisão a céu aberto.
Escola, trabalho, almoço, jantar, escovar os dentes, tomar banho, trocar de roupa, pagar as contas, assistir tevê, arrumar a cama, lavar a roupa, arrumar o quarto, ligar pro Zé, marcar dentista, ir no médico, trocar as fraldas, fazer as compras, ser educado, cumprir as tarefas. Não pense muito e vai dar tudo certo. Apenas faça aquilo, mantenha os pés no chão, mantenha a cabeça cheia de vazios consistentes de realidade. Idiossincrasias em excesso. Engula-as com um pão com manteiga e um café com leite e parta pra luta. A luta de se manter em constante caminho certeiro, sem hesitar nem parar. Olhando pros lados pra ver se está na frente, se está direito. Rumo imutável, inabalável, verdadeiro, na direção do dia seguinte, do insuportável e ordinário dia seguinte que te chama. Na cama, a noite, as lágrimas tem que secar rápido. Elas não pode tomar o espaço reservado para a reconfortante certeza de que acabou. Você sobreviveu de novo, a mais um dia. E isto tem que ser o suficiente pra que você não se faça a inútil pergunta. Se você ganhou a luta, não importa. O que importa é que amanhã tem outra, e que você tem que dormir pra estar bem descansado e pronto para enfrentá-la. Algumas horas de fuga, algumas horas de sono e sonhos. Ou pesadelos com o interminável amanhã e o incorrigível ontem. Pé na estrada, de carona na boleia do caminhão que vai nos levando ao nosso derradeiro destino. Uma morte agonizante e infértil que ingenuamente denominamos vida.

domingo, maio 23, 2004

Às vezes acontece esta desgraça, que você precisa de uma maldita palavra que não existe. É bem diferente da palavra que você quer e não encontra, que escapou da sua cabeça. Tem ocasiões que você precisa de uma palavra que possa dar conta de coisas que palavras não podem fazer. Tem vezes que você precisa de uma salvação, e inutilmente vai caçá-la nas palavras.
Todo o ódio e desgosto que eu preciso, toda a mágoa e os gritos e lágrimas contidos. Toda a repulsa por tudo aquilo que eu desprezo e recuso, toda a insatisfação que eu não consigo por pra fora. Todos os fracassos acumulados, todos os sonhos desfeitos, todas as desilusões criadas. Toda minha decepção, minhas esperanças dilaceradas que se penduram sôfregas e decadentes nas bordas da minha vida, todas as investidas e tentativas e recomeços e esforços e insatisfação e agonia e desespero e tudo de novo e de novo e de novo. Todo o maldito ciclo que vem e se desfaz e se reconstrói com unha e ferro e fogo e carne e sangue e lágrimas e desgosto. Todo o castelo que se constrói, tijolo por tijolo, com imaginação gasta e superações de limites e esforços supremos e sonhos alcançados. Todo o castelo que se põe abaixo em um segundo, uma palavra, um gesto, um olhar. Toda a indiferença, a pena, a lástima, a desgraça. Tudo o que se perde, se destrói, se esvai, se acaba, se esgota, se finda, morre, termina, some, desaparece, perece, desfaz. Todos os gritos que ninguém ouve, todas as gargantas em vão que se criam por uma guerra que não pode ser lutada. Todas as intenções que não se concretizam, os sonhos que não tem sono, as palavras censuradas. Todos os sacrifícios ocultos, as oferendas recusadas, os mundos de beleza e esplendor que mofam em um canto de armário sem nunca cumprir seu desígnio. Todas as verdades encobertas, as mentiras vitoriosas, as falsidades constituídas, os ideais que não importam, a jornada que não se completa, que morre na praia, que se deita, que se esquece. Todas as vinganças que crescem e se elaboram e se alimentam do ódio infindável que se alimenta nos restos e cresce na escuridão e almeja com cada fibra de horror o dia final em que irá ter nas suas mãos o sangue quente, o gozo final, o alimento da vida, todas as vinganças que não acontecem. Todo o amor que se guarda nas pessoas solitárias e tristes, o amor que se transforma em lágrimas amargas de desgosto pelo mundo que as abandona, que vira as costas sem jamais olhar para trás. Todos os pedidos que não são ouvidos, as súplicas soluçantes que são ignoradas, as risadas que se fazem às custas do sofrimento alheio eterno. Todas as dores desprezadas, pequenas demais para existirem ou grandes demais para serem verossímeis. Todos os exageros e antagonismos da sua felicidade, compaixão, alegria, piedade, esperança, carinho, amor, beleza. Tudo o que se quis para as pessoas que mereciam e que não se fez. Todas as mortes injustas e lentas e dolorosas e sofridas. Todas as torturas e angustias e desprezo. Tudo o que um dia eu quis oferecer e me foi enfiado goela abaixo com socos e pontapés no estômago. Toda a amizade fingida, os interesses ocultos, as segundas intenções, as coisas feitas por debaixo do pano, as sacanagens inconfessáveis de uma meia-noite esquecida, as traições descaradas, as reviravoltas injustas, os motins. Tudo o que há de ruim em mim desde sempre e que cresce e se alimenta com a podridão do mundo que se instala em mim a cada dia em doses pequenas e dilacerantes. Todas as coisas boas que um dia moraram em cada coração de cada ser humano bom e ingênuo de cada canto e que se desfaz com o desgosto e a mágoa eterna das amarguras que corroem tudo, tudo o que havia e poderia haver de bom neste mundo. Todos os que se sentem inferiores, injustiçados, que são pisados, humilhados, esquecidos, destruídos, abandonados. Todos os suicídios tristes em quartos de hotel de beira de estrada, em janelas de apartamentos, em festas de aniversário. Todos os natais tristes e solitários, todas as pessoas que ficaram de fora de todas as comemorações, todas as datas especiais que se passa sozinho e triste com uma angustia interminável no peito. Todas as madrugadas na rua, de frio, fome e miséria. Todas as guerras com suas mortes, torturas, mutilações, escoriações, cicatrizes. Todos os roubos, incêndios, homicídios, estupros, seqüestros, estelionatos, extorsões, chantagens, brigas. Tudo o que todas as pessoas já fizeram de mal para as outras, justificando para si mesmas que faziam o bem. Todas as mentiras, todas as pessoas que são adoradas e conquistam um espaço no coração dos outros através de trapaças, manipulações, mentiras e armações. Tudo o que há de ruim e detestável neste mundo, todas as vezes em que não há luz no fim do túnel, não há esperança nenhuma de se livrar desta desgraça que é a vida porque o mundo e as pessoas são podres demais para fazerem alguma coisa que presta. Todas as vezes em que todo o resto do mundo é feliz e eu sou miserável. Todas as vezes em que todos são bons e eu sou um lixo. Todas as vezes que contei com amigos e me decepcionei. Todas as vezes em que coloquei todas as minhas esperanças em alguma coisa que me apunhalou e apunhalou e apunhalou. Todas as vezes que eu quis dizer e ninguém me ouviu, todas as vezes em que eu estava certo e todo mundo disse o contrário. Todas as vezes em que fui bom e disseram que eu fui mau. Todas as vezes em que fiz algo certo e não fui reconhecido. Todos os meus erros estúpidos que não pude consertar, todos os erros que cresceram e dominaram tudo. Todas as pessoas que sofrem e sofrem e sofrem para sempre. Todas as pessoas que já viveram e já morreram e sofreram e foram infelizes e sentiram dor e tudo isto não valeu a pena para nada. Todas as mortes infelizes e sofridas com todos os seus arrependimentos. Todas as pessoas por nascer e todo o seu sofrimento que não existe, mas que ainda existirá e será real e horrível. Tudo o que um dia desejei com todas as minhas forças e não fui capaz de conseguir.

quarta-feira, maio 19, 2004

Podia ainda ouvir incessantemente o barulho que o vaso fizera ao se espatifar contra a porta. Em sua cabeça, mil vezes, ele era ainda mais ensurdecedor. Não existia mais nada que não fosse aquele barulho, pai dos cacos que jaziam no chão da sala. Os gritos já eram mudos, não diziam nada. Um crescente da sinfonia que se compôs, sobrepondo nota acima de nota, elevando a cacofonia ao estado sublime e prodigioso de sua forma, as batidas, os grunhidos, os berros, os gemidos. Toda uma ordem calculada e desmesurada, quebrantada em um espasmo súbito. Apenas a dor exaltada na repentina explosão lavava seu espírito da pueridade infeliz das intenções. As intenções nunca valeram de nada: o mundo se construiria por elas da mesma forma que o vaso pelos seus cacos inertes. A vida se espatifou contra a porta. Eu me espatifei contra você. Meu sonho se espatifou na manhã. Se espatifar uma vida fosse fácil como espatifar o vaso, teria nas mãos a coleção dos cacos que herdou dela. Alguém que já fechou a porta, com um vaso espatifando-se atrás. Alguém cujo telefone toca eternamente, mas que nunca vai ser atendido. Sua porta, fechada, muito antes dos gritos ou do vaso, já tinha espatifado a vida no barulho insolúvel.
Fora uma briga como qualquer outra, os vizinhos podiam confirmar. Só que tinha os cacos do vaso, a porta batida. Tinha coisa de menos, antes de ter coisa demais. Ela, dois quarteirões andando bem rápido pela rua, os passos firmes. As lágrimas não escorriam, seguras em seus olhos como se sua vida dependesse disto. Marejados, vermelhos, agora doíam pelo esforço de não piscar. Se piscasse, elas escorreriam. Ela não enxergava mais nada, a visão obstruída pelas lágrimas que se acumulavam. Em sua cabeça primeiro tinham xingamentos, palavrões, que depois viraram em lista de supermercado, nomes de cds. Qualquer coisa que ela pudesse sussurrar para si mesma por entre os dentes cerrados que rangiam enquanto ela descia a rua em tropeços ofegantes e desconcertados. Estava ocupada demais para prestar atenção no que pensava, tinha que andar rápido e não deixar as lágrimas escorrerem. Depois que as pernas se cansaram o suficiente para questionar o porque do esforço, depois que os olhos ardiam o suficiente para questionar o porque não das lágrimas, foi aí que ela parou, sentou no meio fio e desatinou a chorar. Um choro copioso que assustou qualquer pedestre que pensasse em ajudá-la. Era claro, estava além da ajuda de um passante inocente. Melhor cuidar da própria vida.
Aos cacos do vaso no chão juntaram-se os de dois copos, depois de um prato, depois os do controle remoto e por fim os do enfeite feio de porcelana sobre a mesinha de centro. Acabaram-se as coisas espatifáveis ao seu alcance, e então ele percebeu que jogar coisas na porta não faria ela se abrir de novo, e que ela já não estava mais escutando as coisas se espatifarem na porta. Viu que sua mão tinha sangue, e primeiro achou que tinha se cortado com algum caco. Depois viu que as feridas foram provocadas pelas suas unhas entrando na carne da sua mão, enquanto ele as fechava convulsivamente em ódio irreprimível e irracional. Nada se espatifaria satisfatoriamente a ponto de controlar sua raiva. O ódio impotente crescia, tomando forma de uma angustia irreprimível. Encolhido no sofá, ele chorava como um bebê de colo ao relento. Se sua dor fosse apenas um pouco maior, parecia, talvez ele não precisasse mais se importar com ela. Os dentes dele desfaziam-se enquanto ele esfregava sofregamente sua arcada superior contra a inferior. Os gritos eram abafados pelas almofadas do sofá nas quais sua cara se enterrava, e seus braços tremiam descontroladamente.
Ela, sem perceber, mordia os lábios e afundava seus sapatos recém-lavados na água suja que escorria pela sarjeta. As lágrimas escorriam mais rápido do que caberiam em seus pequenos olhos, e os soluços se atropelavam pela sua boca, sacudindo seu corpo esquelético em chacoalhadas repetidas. Acompanhando seu choro, uma espécie de gemido fino se esgueirava pela sua garganta. Envolvendo seu corpo com seus braços, balançava-se para a frente e para trás. Seu nariz estava vermelho e escorria. O dono da banca de jornal observava a cena, com repulsa e pena pela patética criatura sentada na calçada.
Os sapatos estragaram na água da sarjeta. A televisão ficou sem controle remoto.
Misturou o ontem num copo de pinga, virou goela abaixo. Deitou-se de lado e quis dormir. Quis espatifar o mundo contra a porta, afogar a vida na sarjeta. Teve medo da vida não lhe pertencer mais.

terça-feira, maio 18, 2004

O blig apagou meu blog e com isto levou cerca de dois anos de textos meus. Que eu gostava e que eu não gostava. Só sobrou a parte que eu tenho salva no computador. Que pena que a gente perde as coisas assim.
Eu reparei que sinto falta de mim mesmo. Não sei onde me procurar.

segunda-feira, maio 17, 2004

Continuação do meu post que eu não escrevi.

Poodles são criaturas estúpidas, cretinas de verdade. Mas este não é o caso, atualmente eu não me daria ao trabalho de sentar pra escrever um tratado sobre meu desgosto por poodles. O caso aqui é muito mais grave, pois apesar de nossa tendência a antropomorfização de animais estúpidos, eles continuam sendo criaturas irracionais que não tem culpa ou vontade sobre suas imbecilidades, sejam quais forem elas. Infelizmente, não podemos dizer o mesmo sobre um indivíduo que venha a gostar de uma criatura assim. Especialmente alguém que sabe muito bem como e porque não gostar de poodles. Não é uma coisa incrivelmente patética aquelas madames cretinas que fazem sua vida girar em torno de um cachorrinho cretino, deixando que aquele bicho conduza suas vontades de um lado para o outro? O poodle, por outro lado, nunca será capaz de retribuir aquele sentimento cultivado por ele. Poodles não amam: eles comem, dormem, latem, defecam e são pentelhos, mas eles não vão ter amizade ou estima por você do mesmo modo que você pode ter por eles. Nunca. E é uma coisa triste quando você ignora este fato.
Uma pessoa que odeia poodles, quando passa a gostar de um poodle, em geral não deixa de odiar poodles. Você olha o resto dos poodles do mundo e vê que eles são idiotas. Aí você olha bem pro tal poodle que você gosta, e vê coisas idiotas nele também. Aí você passa a odiar a si mesmo, por fazer algo que você considera imbecil, como gostar de um poodle. Aquela sua vontade enorme de bicar poodles na parede começa a se voltar contra você, e você quer bicar sua própria cabeça contra a parede. Você olha alguém fazendo aquelas vozes idiotas de conversar com bebês e cachorros, e uma pessoa se humilhando desesperadamente para ganhar atenção do cachorro. E de repente você se flagra fazendo o mesmo, e sente náuseas de ser aquela pessoa, e mais ainda por continuar fazendo aquilo. Tem uma hora que você começa a defender seu poodle, comparando com os outros, tentando provar para si mesmo e para todos que ele é melhor. Ridículo. E provavelmente o mais lamentável é quando você percebe que por mais ridículo que seja, por mais que você faça de tudo para gostar do poodle, ele simplesmente prefere um pedaço de carne ou outra pessoa que tenha mais talento com poodles idiotas.
Pro inferno os poodles e pro inferno os idiotas que gostam deles.

O2

I wanna run away
I wanna get away
but I will never get up
oh won't you help me up

I rely on oxygen
I depend on the bitter snow
I rely on oxygen
I depend on the bitter cold

I want to know
why it hurts to stay
and hurts to go away
will I be ok?

Crawled out of the mud
this filth you called your love
slept for countless days
but I will be ok

I wanna run away
I wanna get away
but I will never get up
oh won't you help me up

I rely on oxygen
I depend on the bitter snow
I rely on oxygen
I depend on the bitter cold

I didn't know I could feel this low
so afraid that I'll watch you go
I didn't know I could feel this low
so afraid that I'll watch you go

Take my strength out
but I'm not down
Write this reverse
I'm not down

I wanna run away
I wanna get away
but I will never get up
oh won't you help me up

Take my strength out
but I'm not down
Write this reverse
I'm not down

sábado, maio 15, 2004

- Sabe Verônica, eu vejo você em silêncio por tanto tempo e você me faz pensar muito sobre isto. Acho que às vezes as pessoas falam demais e dizem muitas coisas que não valem nada para elas e para os outros. Mas nos seus olhos eu vejo alguém observando o mundo e aprendendo, eu vejo alguém que parece mais sábia do que o senso comum. Acho que eu tenho que te agradecer muito por me ensinar o valor das palavras.

Verônica continuou quieta, e a seu interlocutor pareceu mais uma demonstração sobre a grandeza das palavras. Mas se ela se desse ao trabalho de abrir a boca pra lhe dizer algo, seria mais ou menos assim:

- Grandeza das palavras o caralho. Eu não vou gastar meu tempo pra falar um monte de merda inútil pra gente que só para pra ouvir os outros porque depois quer que os outros parem para ouvir também. Se as pessoas achassem que as merdas que falam valessem alguma coisa, aí sim guardariam para elas ao invés de despejar em torrentes intermináveis de asneiras descontroladas. Eu só tenho merda pra falar, merdas que nem esta que você acabou de me falar, e por isto não me dou ao trabalho de abrir a minha boca. No dia em que falar for valer a pena, pode apostar também que não vou perder meu tempo falando com você. Eu passaria tanto tempo procurando alguém pra quem valesse a pena falar, que acabaria ficando quieta do mesmo jeito.

- É. - foi o que Verônica respondeu depois de um tempo. - você tem dois reais pra eu pegar o ônibus?

Ela sabia gastar sua saliva com o que era importante de verdade.

sexta-feira, maio 14, 2004

Hoje faz um ano que cortei meu cabelo.
Conclusão: meu cabelo cresce uns sete centímetros por ano.
Quanto as outras coisas que poderia dizer, só existe uma coisa a falar: Quando disser algo, cuide para que seja melhor do que o silêncio.
Vou cuidar, cada vez mais. Principalmente quando alguém está ouvindo, e mais ainda quando forem vocês, de fora da minha cabeça.

The trick is to keep breathing

She's not the kind of girl
Who likes to tell the world
About the way she feels about herself
She takes a little time
In making up her mind
She doesn't want to fight against the tide

And lately,
I'm not the only one
I say never trust anyone

Always the one who has to drag her down
Maybe you'll get what you want this time around

Can't bear to face the truth
So sick, he cannot move
And when it hurts he takes it out on you

And lately,
I'm not the only one
I say never trust anyone

Always the one who has to drag her down
Maybe you'll get what you want this time around

The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing

She knows the human heart
And how to read the stars
Now everything's about to fall apart

I won't be the one who's going to let you down
Maybe you'll get what you want this time around
(The trick is to keep breathing)
I won't be the one who's going to let you down
(The trick is to keep breathing)
Maybe you'll get what you want this time around

The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing
The trick is to keep breathing

--------------------------------

Hand in my pocket

I’m broke but I’m happy
I’m poor but I’m kind
I’m short but I’m healthy, yeah
I’m high but I’m grounded
I’m sane but I’m overwhelmed
I’m lost but I’m hopeful baby
What it all comes down to
Is that everthing’s gonna be fine fine fine
I’ve got one hand in my pocket
And the other one is giving a high five
I feel drunk but I’m sober
I’m young and I’m underpaid
I’m tired but I’m working, yeah
I care but I’m restless
I’m here but I’m really gone
I’m wrong and I’m sorry baby
What it all comes down to
Is that everything’s gonna be quite alright
I’ve got one hand in my pocket
And the other is flicking a cigarette
What is all comes down to
Is that I haven’t got it all figured out just yet
I’ve got one hand in my pocket
And the other one is giving the peace sign
I’m free but I’m focused
I’m green but I’m wise
I’m hard but I’m friendly baby
I’m sad but I’m laughing
I’m brave but I’m chicken shit
I’m sick but I’m pretty baby
What it all boils down to
Is that no one’s really got it figured out just yet
I’ve got one hand in my pocket
And the other one is playing the piano
What it all comes down to my friends
Is that everything’s just fine fine fine
I’ve got one hand in my pocket
And the other one is hailing a taxi cab...

quinta-feira, maio 06, 2004

Blam!
É um barulho assustador o de uma porta batendo. Assustador e triste.
Eu nunca achei que seria uma decisão fácil, mas acho que seria ainda mais estranho pensar que ela seria assim tão difícil. Por ser assim tão mais difícil do que eu achei que seria, ela foi procrastinada por tanto tempo. Mas eu não podia fazer isto para sempre.
As coisas começaram bem antes dos meus primeiros dias. Elas começaram no colegial, quando eu decidi abandonar uma escola que eu, apesar de tudo, amava, pra ir para uma que eu odiava. Depois disto foi pior, eu tive que abandonar uma faculdade que gostava para voltar pro cursinho. E eu já estava embarcando pro segundo ano de cursinho, sem hesitações nem nada.
Daí vieram os primeiros dias, e destes eu não vou esquecer nunca. Só quem estava lá sabe como aquilo foi horrível. Eu sobrevivi, mas as coisas não mudaram. Os primeiros dias arrastam-se em primeiras semanas e primeiros meses. Provas, cadáveres, relatórios, isolamentos. Quando as coisas pareciam melhorar elas pioravam. Mas sabe o que? Eu sobrevivi, e bem. Eu consegui me virar de uma maneira surpreendente, e descobri coisas sobre mim mesmo que eu jamais suspeitaria que existiam. E descobri coisas sobre os outros que jamais suspeitaria. Eu excedi limites que nem mesmo sabia que existiam. No final, eu já estava tirando de letra.
O tanto de merda que eu tive que aguentar, que eu tive que superar. E, quando você menos espera, você olha pros lados e percebe que conquistou um espaço seu, só seu, e que nenhum filho da puta pode tirar ele de você. Depois de um bocado de percalços, eu tive meu espaço. Eu olhava pra pessoas e podia, sinceramente, considerá-las amigos. Eu não tinha nada a temer, eu não devia merda nenhuma para ninguém. Pro bem ou pro mal, eu estava em casa.
E foi bem aí que eu tive que ir embora.
Eu carreguei o mundo nas costas por dois meses, e o fiz com uma habilidade que novamente me surpreendeu. Meu coração se rasgou, e de todos os jeitos eu tentei remendar os pedaços da minha vida que me puxavam de um lado pro outro.
Hoje eu acabei com isto, e acho que foi a decisão mais difícil da minha vida. Cheguei lá, pedi o papel, fui carimbar, até que estava segurando as pontas. Não olhe pra trás, não olhe pra trás. Aí aparece do meu lado uma Priscila, e depois eu vejo os olhos dela marejados. Não adianta, não tem como explicar o que foi assinar aquele papel, o que foi guardar este sonho na estante, o que foi mudar de caminho depois de ter lutado tanto por este.
Desculpem o punhado de clichês idiotas, mas é como as coisas aparecem. Você não escolhe a medicina, de verdade. Ela escolhe você, e ela te persegue até o fim, incessantemente. E eu sei que trancar ou não trancar, fazer ou não fazer um curso não muda nada disto. Ela vai me perseguir pra sempre, de um jeito ou de outro, quer eu queira, quer não. E eu vou ter que aprender a conviver com isto. A porta pode estar fechada, mas ela ainda está ali.
Agora, é bom que eu faça esta merda de letras direito, é bom que eu faça alguma coisa pra valer. Porque se eu fiz isto à toa, pode apostar que eu nunca vou me perdoar. E se eu perceber que não fiz nada direito em um ano, pode apostar que eu vou voltar correndo praquela porta, antes que ela se feche pra sempre. Um ano pra destrancar a matrícula, este é o prazo. Um ano pra ter certeza que eu quero fazer letras, este vai ser o prazo também. Porque se eu não tiver certeza de que é isto, eu volto pra medicina. Eu sei que ela sempre vai me querer de volta tanto quanto eu sempre vou querer voltar pra ela.
Mas agora ela está trancada. Agora eu sou um aluno de letras.
Desejem-me sorte, porque eu vou precisar.

quarta-feira, maio 05, 2004

Basket Case

Do you have the time to listen to me whine
About nothing and everything all at once
I am one of those
Melodramatic fools
Neurotic to the bone
No doubt about it

Sometimes I give myself the creeps
Sometimes my mind plays tricks on me
It all keeps adding up
I think I’m cracking up
Am I just paranoid ?
Or Am I just stoned

I went to a shrink
To analyze my dreams
She says it’s lack of sex that’s bringing me down
I went to a whore
He said my life’s a bore
And quit my whining cause it’s bringing her down

Grasping to control
So you better hold on

Sometimes I give myself the creeps
Sometimes my mind plays tricks on me
It all keeps adding up
I think I’m cracking up
Am I just paranoid ?
Or Am I just stoned

segunda-feira, maio 03, 2004

Hey

hey
been trying to meet you
hey
must be a devil between us
or whores in my head
whores at my door
whores in my bed
but hey
where
have you
been if you go i will surely die
we're chained

uh said the man to the lady
uh said the lady to the man she adored
and the whores like a choir
go uh all night
and mary ain't you tired of this
uh
is
the
sound
that the mother makes when the baby breaks
we're chained
Where is my mind?

Ooooooh - stop

With your feet in the air
and your head by the ground
Try this trick and spin it, yeah
Your head will collapse,
and there's nothing in it
and you'll ask yourself:

Where is my mind?
Where is my mind?
Where is my mind?

Way out,
in the water see it swimmin'

I was swimmin' in the Caribean
Animals were hiding behind a rock
Exept the little fish,
when they told me east is west
trying to talk to me to me
koy-koy

Where is my mind?
Where is my mind?
Where is my mind?

Way out,
in the water see it swimmin'

With YOUR feet in the air
and your head on the ground
Try this trick and spin it, yeah
Your head will collapse
and there's nothing in it
and you'll ask yourself:

Where is my mind?
Where is my mind?
Where is my mind?

Way out,
in the water see it swimmin'

With your feet in the air
and your head on the ground
Try this trick and spin it, yeah...

sexta-feira, abril 23, 2004

Eu escrevi um mini-conto, olha só:

Rotina

Ontem, quando acordei, algo horrível havia me acontecido:
Nada.



Acho que ele ainda precisa de melhoras. O título alternativo que eu pensei para ele é "Gregor Samsa às avessas".
Cada vez mais acho que este negócio é coisa de escritor frustrado, especialmente cronista ou poeta.
Acho que faz sentido eu não estar escrevendo muito aqui.
Bom, sei lá, até outra hora.

quinta-feira, abril 08, 2004

Quando parecer que a vida não tem mais nada de bom a lhe oferecer, procure consolo e refúgio no braço dos velhos e bons amigos.
Hoje passei o dia jogando Shadowrun.
Ontem passei a madrugada jogando Super Metroid.

segunda-feira, abril 05, 2004

Quando eu tenho algum tempo pra fazer as coisas, eu perco toda a minha disposição para fazê-las.

sábado, março 27, 2004

Desde que eu comecei a escrever redações para vestibulares, há milhões e milhões de anos atrás, eu procurei aprender o que o corretor queria que eu escrevesse, pois obviamente era bem diferente do que eu gostaria de escrever.
Quando eu achei que tinha aprendido as coisas funcionavam mais ou menos assim:
1- Todas as minhas redações tinham exatamente a mesma estrutura: um parágrafo de introdução, um de desenvolvimento, e um de conclusão.

2- Todos os meus professores diziam sempre: não use os clichês de sempre, os corretores não gostam. Depois de um tempo eu consegui entender o que isto queria dizer: use os mesmo clichês de sempre, de um modo que não pareça que você está usando-os.

3-Dê os argumentos mais óbvios e evidentes, justificando bem direitinho suas opiniões.

4- Não dê suas opiniões, caso você tenha alguma opinião que não seja absolutamente superficial e que pode ser plenamente explicada em trinta linhas. Escolha um ponto de vista simples e defenda-o claramente. Use argumentos claros e óbvios. Como um jornalista faria.

5- NUNCA use recursos estilísticos ousados e não tente fazer alguma coisa que não poderia ser encontrada na Veja ou na Folha de São Paulo.

6- Nunca ultrapasse os espaços, use uma letra legível, use a pontuação como uma pessoa normal e que sabe escrever, lembre-se sempre de colocar o título, não erre a ortografia.

7- Nada de títulos muito inventivos. Que ele faça uma clara referência ao seu texto e, se for um joguinho de palavras "esperto", melhor.

Se você seguir mais ou menos todos estes mandamentos do escritor otário, é bem provável que você não tire menos de oito na redação.
Eram estas as minhas pretensões quando me defrontava com redações em vestibular, e foi esta minha pretenção quando me deparei com um tema absurdamente difícil para uma exposição em trinta linhas no vestibular deste ano. Joguei minhas baboseiras lá e pronto.
Eis que um tempo depois eu recebo uma carta da fuvest e blá, blá, blá. Minha teoria para o sucesso do escritor bobão está confirmada, e minha redação destaca-se entre as 50 "melhores" da fuvest.
Se você quiser aprender a escrever como um corretor e uma professora gostam, vai lá no www.fuvest.br e confere a minha, é o exemplo 21.
Além disto, pode-se concluir que as pessoas que prestam vestibular não desenvolveram satisfatoriamente a habilidade de enrolar corretores, porque minha redação é um verdadeiro lixo, mesmo para os meus padrões de redação de vestibular.
Ironicamente, é a primeira vez que algo que eu escrevi recebe algum reconhecimento de uma comissão julgadora, e é justamente algo que eu acho extremamente medíocre. Talvez eu esteja predestinado a ser brilhantemente medíocre. Talvez devesse viver disto e escrever o que eu gosto paralelamente.

Mudando de assunto, a diversão do fim de semana é:
Simpósio sobre suicídio :-)

quinta-feira, março 25, 2004

Eu sou uma doença auto-imune.
A cada dia produzindo anticorpos contra tudo aquilo que constrói minha vida.
Destruindo o que me cria, eliminando o que me sustenta.
Meus pensamentos são macrófagos que fagocitam minha esperança, minhas vontades, meus acertos. Lenta e iompiedosamente lisando a fina parede que os mantém integros.
Enzimas que corroem meus tecidos mentais.
Minha vida desfazendo-se em massa amorfa, inevitavelmente, a cada dia.
Minha vida metamorfoseando-se em arrastada angustia, que se prolonga e se alastra em um dolorido desejo da morte que não virá.
A agonia da destruição causada por mim.


Everybody Hurts

When the day is long and the night, the night is yours alone,
When you're sure you've had enough of this life, well hang on
Don't let yourself go, 'cause everybody cries and everybody hurts sometimes

Sometimes everything is wrong. Now it's time to sing along
When your day is night alone, (hold on, hold on)
If you feel like letting go, (hold on)
When you think you've had too much of this life, well hang on

'Cause everybody hurts. Take comfort in your friends
Everybody hurts. Don't throw your hand. Oh, no. Don't throw your hand
If you feel like you're alone, no, no, no, you are not alone

If you're on your own in this life, the days and nights are long,
When you think you've had too much of this life to hang on

Well, everybody hurts sometimes,
Everybody cries. And everybody hurts sometimes
And everybody hurts sometimes. So, hold on, hold on
Hold on, hold on, hold on, hold on, hold on, hold on
Everybody hurts. You are not alone


quarta-feira, março 24, 2004

Dez anos de Maria

Prazer.
Você é um idiota.
Te odeio.
Nunca.
Nunca.
Nunca.
Só desta vez.
É a última vez.
Até que você é legal.
Te adoro.
Te amo.
Eu preciso de você.
Te amo.
Te amo.
Te amo.
Te odeio.
Te amo.
Te amo.
Te odeio.
Te amo.
Te odeio.
Te adoro.
Te odeio.
Você é um idiota.
O que eu fiz com a minha vida?
Te odeio.
Te odeio.
Te odeio.
Até nunca mais.

terça-feira, março 23, 2004

Certas vezes, a única maneira de lidar com um problema é ignorá-lo ao máximo.
Muitas coisas são difíceis de se ignorar.
Hoje eu declaro guerra ao amor e à esperança.
Bem-vinda novamente Melancolia, que sua estada seja frutífera e produtiva.
Já estava estranhando esta timidez retraída, que nunca foi pertinente a esta velha companheira.

King of Pain


There’s a little black spot on the sun today
It’s the same old thing as yesterday
There’s a black hat caught in a high tree top
There’s a flag-pole rag and the wind won’t stop

I have stood here before inside the pouring rain
With the world turning circles running ’round my brain
I guess I’m always hoping that you’ll end this reign
But it’s my destiny to be the king of pain
There’s a little black spot on the sun today
That’s my soul up there
It’s the same old thing as yesterday
That’s my soul up there
There’s a black hat caught in a high tree top
That’s my soul up there
There’s a flag-pole rag and the wind won’t stop
That’s my soul up there
I have stood here before inside the pouring rain
With the world turning circles running ’round my brain
I guess I’m always hoping that you’ll end this reign
But it’s my destiny to be the king of pain
There’s a fossil that’s trapped in a high cliff wall
That’s my soul up there
There’s a dead salmon frozen in a waterfall
That’s my soul up there
There’s a blue whale beached by a springtime’s ebb
That’s my soul up there
There’s a butterfly trapped in a spider’s web
That’s my soul up there
I have stood here before inside the pouring rain
With the world turning circles running ’round my brain
I guess I’m always hoping that you’ll end this reign
But it’s my destiny to be the king of pain
There’s a king on a throne with his eyes torn out
There’s a blind man looking for a shadow of doubt
There’s a rich man sleeping on a golden bed
There’s a skeleton choking on a crust of bread
King of pain

There’s a red fox torn by a huntsman’s pack
That’s my soul up there
There’s a black-winged gull with a broken back
That’s my soul up there
There’s a little black spot on the sun today
It’s the same old thing as yesterday

I have stood here before in the pouring rain
With the world turning circles running ’round my brain
I guess I always thought you could end this reign
But it’s my destiny to be the king of pain
King of pain
King of pain
King of pain
I’ll always be king of pain

sábado, março 13, 2004

Viver é uma arte. A mais completa delas.
Tenho temas aos montes para posts mimimi, mas além de não estar em um estado de espírito apropriado, acho que já tive minha cota de comentários me mandando tomar no cu :-P
Mas só pra constar, continuo com problemas pra resolver minha vida. E sempre tem alguém bem intencionado com um conselho pra ajudar. "Larga a medicina, letras é muito mais a sua cara". "Larga a letras, você sempre quis ser psiquiatra". "Faz os dois, você consegue e no fim vai valer a pena". Ou simplesmente "Vai tomar no cu". O foda é que todos eles tem razão. Mas eu não estou com vontade de pensar nisto agora.

My Favorite Things Lyrics

Raindrops on roses and whiskers on kittens
Bright copper kettles and warm woollen mittens
Brown paper packages tied up with string,
These are a few of my favorite things.

Cream colored ponies and crisp apple strudel,
Door bells and sleigh bells and schnitzel with noodles
Wild geese that fly with the moon on their wings,
These are a few of my favorite things.

Girls in white dresses and blue satin sashes,
Snow-flakes that stay on my nose and eye-lashes,
Silver white win-ters that melt into spring,
These are a few of my favorite things,

When the dog bites,
When the bee stings,
When I'm feeling sad,
I simply remember my favorite things,
And then I don't feel, so bad.

(Repeat song)

quarta-feira, março 10, 2004

Melhorou...
Ando muito instável, preciso me distrair e manter a cabeça ocupada. Pelo menos isto não anda difícil de fazer, pena que na maior parte do tempo não é com coisas agradáveis.
Estou apaixonado.
Amores a primeira vista costumam ser os mais cruéis.
Espero que eu sobreviva.
Acho que minha melancolia me consumiu de uma maneira tão podre e doentia que está prestes a explodir em um amontoado irracional de ódio descontrolado.
Eu só queria poder colocar, por um dia que fosse, dentro da minha cabeça pra você ver como ela parece por dentro. Talvez assim você pudesse me explicar.
Talvez assim você olhasse mais pra você mesmo.
Passar seis meses assistindo alguém não se compara a passar um dia sendo alguém.
É fácil, sempre foi e sempre vai ser, desdenhar do que alguém sente. É difícil saber quantas mentiras são necessárias pra construir uma verdade, e como e triste ver uma verdade destruindo por completo um castelo bem forjado de mentiras, deixando-o completamente desabrigado diante de uma realidade, quem me dera, fosse também uma mentira fácil de rasgar.
Suas verdades são fáceis, e pode apostar que eu me dei ao trabalho de conhecê-las, eu as conhecia antes de você.
Espero que um dia, antes de abusar do poder que você tem nas mãos, você se dê ao trabalho de conhecer outras verdades.
Seis meses, um mês. Uma semana, um dia, poucos segundos. É tempo o que você quer? É tempo que eu te tirei?
Você pode dar sua vida em um segundo, mas não poderia nunca tomá-la de volta da mesma maneira que a entregou.
Nem em um mês de desprezo, nem em um ano de torturas.
Eu não quero, de novo, acreditar tanto no egoísmo do amor.
Eu não quero acreditar que todo amor não passa de amor próprio.
Eu não quero deixar de acreditar nas segundas chances.
Eu me lembro das tentativas, dos esforços, da persistência. Eu não quero ser o único a lembrar que, um mês pra lá vale o mesmo que um mês pra cá. E que eu tive minha parcela de tempo, e que eu precisava cobrar um pouco dele.
Eu acho que vou explodir. Eu não aguento mais ser eu mesmo. Ou eu só não aguento mais ter que pensar tanto e tanto e tanto, e ter a horrível e solitária idéia de que sou o único a pensar e a lembrar pra sempre.

sábado, março 06, 2004

Pontos altos do dia (em ordem cronológica):

-Aula de saúde coletiva com um vídeo sobre saúde direcionado à população, apresentado pela Regina Duarte, no qual eu tive o privilégio de aprender QUATRO vezes SEGUIDAS como fazer o soro caseiro, e de quebra ainda aprendi que existem bichinhos pequenininhos que chamam micróbios e que podem dar doenças, como tosse comprida ou cocô mole. Vivendo e aprendendo né?

-Bater o carro numa madame que não saber manobrar seu automóvel sem ocupar toda a rua e verificar se alguém vem vindo.

-Debate sobre diversidade sexual no auditório da história/geografia.

-Festança da letras em meio ao lamaçal formado pela chuva na frente do prédio da filosofia/sociais.

-Tomar uma meia de seda no Rei das Batidas com quatro homossexuais do sexo masculino.

-Terminar a maravilhosa programação da noite à meia noite.

-Não conseguir encontrar nenhuma das pessoas que queria.

-Chegar em casa e ligar o icq.

-Dar pau no icq.

-Abrir o icq2go.

-Dar pau no icq2go.

-Escrever um post cretino no blog e ir dormir em seguida, com a vã esperança de que o resto do fim de semana seja menos imbecil e que me dê forças para mais uma semana de rotina massacrante.

-Chegar à triste conclusão de que a grande esperança da minha vida concentra-se em um curso da FFLCH, com falta de professores e condições precárias. Se isto não der certo, rezar.

sexta-feira, março 05, 2004

Das músicas significativas (e, além disto, pra mim é uma das músicas que melhor retrata Changeling):

The Logical Song
(Supertramp)

When I was young, it seemed that life was so wonderful,
A miracle, oh it was beautiful, magical.
And all the birds in the trees, well they’d be singing so happily,
Joyfully, playfully watching me.
But then they send me away to teach me how to be sensible,
Logical, responsible, practical.
And they showed me a world where I could be so dependable,
Clinical, intellectual, cynical.

There are times when all the world’s asleep,
The questions run too deep
For such a simple man.
Won’t you please, please tell me what we’ve learned
I know it sounds absurd
But please tell me who I am.

Now watch what you say or they’ll be calling you a radical,
Liberal, fanatical, criminal.
Won’t you sign up your name, we’d like to feel you’re
Acceptable, respecable, presentable, a vegtable!

At night, when all the world’s asleep,
The questions run so deep
For such a simple man.
Won’t you please, please tell me what we’ve learned
I know it sounds absurd
But please tell me who I am.

terça-feira, março 02, 2004

Das ironias da vida:
Você pode fazer de tudo por uma pessoa, dedicar-se integralmente a realizar todos seus desejos e necessidades e ver esta pessoa grata e feliz. Provavelmente um dia esta pessoa vai estimá-lo muito menos do que a outro que nem ao menos se importa com a pessoa em questão.
Não acredita? Tenha filhos e espere um pouco, só para dar um exemplo simples.

Dos aniversários significativos:
Lou Reed fez 60 anos hoje.

Das músicas significativas pra mim:

Sail Away Sweet Sister

Hey little babe you're changing
Babe are you feeling sore?
It ain't no use in pretending
You don't wanna play no more

It's plain that you ain't no baby
What would your mother say?
You're all dressed up like a lady
How come you behave this way?

Sail away sweet sister
Sail across the sea
Maybe you'll find somebody
To love you half as much as me
My heart is always with you
No matter what you do
Sail away sweet sister
I'll always be in love with you

Forgive me for what I told you
My heart makes a fool of me
You know that I'll never hold you
I know that you gotta be free

Sail away sweet sister
Sail across the sea
Maybe you'll find somebody
To love you half as much as me
Take it the way you want it
But when they let you down my friend
Sail away sweet sister
Back to my arms again

Hot child don't you know you're young
You got your whole life ahead of you?
And you can throw it away too soon
Way too soon

Sail away sweet sister
Sail across the sea
Maybe you'll find somebody's
Gonna love you half as much as me
My heart is always with you
No matter what you do
Sail away sweet sister
I'll always be in love with you

Dos horários:
Não há tempo pra desenvolver idéias, tenho 30 minutos pra estar na usp.
tchau.

domingo, fevereiro 29, 2004

Aparentemente, de acordo com experimentos realizados hoje na ilustre residência em que me encontro, torna-se evidente que, por mais que um indivíduo se afogue em um insosso e gigantesco mar de tédio e desilusão consigo mesmo, é difícil que este venha a falecer naturalmente disto, levando em conta que algo tão infrutífero e trabalhoso como o suicídio não se encontra entre os possíveis planos de ação que o ser supra-citado possa vir a realizar eventualmente.
Tendo em vista que o marasmo que vem a inundar os dias do sujeito em questão deve-se a nada menos do que sua incompetência para liderar sua vida de uma maneira um pouco mais agradável do que o ato de ouvir a biblía narrada pelo Cid Moreira, ou retalhar seu corpo com uma gilete e mergulhar em uma banheira de ácido, em nenhum momento pode-se contar com a habilidade e perícia do indivíduo em transformar de tal forma a sua presente situação, levando-o, enfim, a uma situação prazeirosa e de grande conforto e diversão.
Portanto, a não ser que alguma ajuda suprema venha neste momento oportuno, a tendência é que o experimento realizado se prolongue indefinidamente, comprovando assim os resultados de uma vida idiota a longo prazo sobre a medíocre psique de tal desafortunada criatura.
Um "Manual prático para imbecis: Como viver sua vida sem ser um merda" viria a calhar. Além disto, apostando na alta probabilidade de que venham a existir outros seres com similar inabilidade para viverem suas vidas (em grau menor do que o indivíduo em questão, obvamente), torna provável que o autor de tal obra venha a enriquecer fartamente com os direitos autorais de tal obra.
Amanhã, teoricamente, é mais um novo começo. Ciclo básico de Letras, blá, blá, blá.
Eu tenho as coisas perfeitas, arranjadas, prontas, de mão beijada.
Estudo medicina sem nunca ter estudado que nem um condenado no cursinho, meus pais não se importam, até ficam felizes aliás, de pagar uma faculdade obscenamente cara para mim. Eu entrei em letras sem ter estudado um puto pra isto, e ainda entrei com umas setecentas vagas de folga.
O resto é fácil, pode ter certeza. Estudar um pouco a mais, um pouco de força de vontade, determinação. Eu poderia estudar lingüística, neurologia, psiquiatria e virar um neuropsicólogo. Trabalhar em pesquisa numa área maravilhosa e ainda de quebra ajudar um monte de gente. Pra citar só uma das inúmeras possibilidades.
Agora, o que eu tenho a fazer é evidente e nítido para mim. Organizar um bolão de apostas, quanto tempo eu levo pra jogar fora minhas chances de novo?
Eu nunca vou conseguir ser um daqueles intelectuais que abdicam de sua vida pessoal e estudam até não poder mais. Mas isto facilitaria minha vida enormemente.
Foda-se, eu não quero escrever nada, só não agüentava mais me encherem o saco pra atualizar o blog. Tá feito, pelo menos isto dá pra fazer sem jogar merda no ventilador.

domingo, fevereiro 08, 2004

O que eu devo pensar quando uma escritora fodona morre enquanto eu estou lendo um livro dela pela primeira vez?
Errar é humano, insistir no erro é burrice.
A única conclusão que posso tirar disto é que sou burro. Eu continuo fazendo o mesmo tipo de besteira eternamente. Por exemplo: sei que meu ano não começou lá grandes coisas e a tendência é piorar. Voluntariamente me meti em uma encrenca das grandes, vou entrar na minha terceira faculdade e, no caso de tentar fazer duas ao mesmo tempo, vou passar mais de doze horas do meu dia no maravilhoso e estimulante meio acadêmico. É óbvio que não vai dar certo e eu sempre soube disto. Vou ter que tomar uma decisão e vou adiar ela o máximo possível e, quando tomar, provavelmente vou me arrepender.
Enfim, eu vou empurrando tudo com a barriga até as coisas darem bem errado. E pra arranjar motivações, invento alguma esperança estúpida. No momento, minha esperança estúpida é que eu me apaixone pela letras e largue a medicina sem o menor peso na consciência, arranjando para mim uma nova e maravilhosa vida.
Eu não ando bom para entreter pessoas com textos em blog, a não ser que gostem de historinhas chatas e compridas.

sexta-feira, fevereiro 06, 2004

Boa, imbecil.
Eu sei mesmo como estragar minhas oportunidades.
Ah, Thaís, acho que vou começar uma contra-campanha, a favor dos blog herméticos. Eu já me sinto estúpido o suficiente sem ficar listando os motivos da minha imbecilidade.

quarta-feira, fevereiro 04, 2004

Don't you want somebody to love?
(Jefferson Airplane)


When the truth is found to be lies
And all the joy within you dies

Don't you want somebody to love
Don't you need somebody to love
Wouldn't you love somebody to love
You better find somebody to love

When the garden flowers baby are dead yes
And your mind is full of red

Don't you want somebody to love
Don't you need somebody to love
Wouldn't you love somebody to love
You better find somebody to love

Your eyes, I say your eyes may look like his
But in your head baby I'm afraid you don't know where it is

Don't you want somebody to love
Don't you need somebody to love
Wouldn't you love somebody to love
You better find somebody to love

Tears are running ah running down your breast
And your friends baby they treat you like a guest

Don't you want somebody to love
Don't you need somebody to love
Wouldn't you love somebody to love
You better find somebody to love

segunda-feira, fevereiro 02, 2004

Último Post:

Rainha de Esplendor: Perdida em seu Lar

A jornada até o Palácio da Rainha de Espadas foi bem mais curta, e Coração de Boneca caminhou com um ânimo renovado. Pela primeira vez ele sabia para onde seguia, desde que deixara o Palácio de Cristal, há tanto tempo atrás. Seu Coração remoia-se em saudades, carregando a imagem de sua Rainha. Mas agora sua saudade o impulsionava, fazendo com que ele esquecesse das dores em suas pernas cansadas, e aproximando-o cada vez mais do Reino de Espadas.
A Rainha de Espadas não passava mais seus dias dentro de seu Palácio. Disfarçando como podia os seus encantos de Rainha, ela passava-se por uma andarilha nas vilas e povoados de seu Reino. Vestida em pobres andrajos ela circulava pelas ruas, que eram como veias e artérias correndo pelo Coração pulsante de seu Reino, trazendo e levando as vidas que construíam toda a maravilha de seu Reino, as pessoas que mantinham erguido seu Palácio e sustentavam sua criação. Ela peregrinava querendo encontrar algo, e ela estava perdida dentro de seu próprio lar. Dia após dia, ela vagou rumo às fronteiras de seu Reino, temendo cada vez mais pela sorte de seus domínios e pelos Corações de seus súditos.
Quando a Rainha de Espadas chegou no limite de seu Reinado, e estava tentando tomar a difícil decisão sobre deixar ou não o seu lar, ela encontrou um viajante que queria entrar no Reino de Espadas. No momento em que avistou aqueles olhos cansados e marejados, ela esqueceu-se de todo o resto. Coração de Boneca, por sua vez, sabia estar ainda longe do Palácio, pois o Reino de Espadas era extenso e a Rainha morava longe de suas fronteiras. Mas ele levava consigo o Coração da Rainha de Copas, que não se enganaria quanto a seus Desejos. E este Coração pulsou fortemente quando Coração de Boneca avistou uma mulher desconhecida, parada bem na fronteira do Reino de Espadas. Ele precisava descobrir quem ela era.
- Com licença, - Coração de Boneca disse cautelosamente, enquanto a própria Rainha tentava entender o que havia naquele estrangeiro que lhe abalava tanto. – eu estou procurando o Palácio da Rainha. Você pode me dizer para que direção ele fica?
Aquele disfarce nunca seria suficiente para enganar Coração de Boneca, que já havia percebido algo diferente no Coração daquela estranha. No entanto, mesmo que ele sentisse o Coração da Rainha de Copas tornando-se diferente perto daquela mulher, ele não conseguiu imaginar que ela era a Rainha de Espadas, tão longe de seu Palácio. E a Rainha de Espadas lutava consigo mesma agora. Por tanto tempo ela procurou ignorar aquele Vazio dentro de si, e agora os olhos de Coração de Boneca diziam a ela que aquele Vazio era maior do que ela havia pensado, e que o Coração dela não mais pertenceria apenas a ela própria. Seu Coração queria pertencer a Coração de Bonecas, que mais uma vez conquistava sem desejar isto.
- Quem é você? O que quer no Palácio? – Ela sabia que não havia mais como escapar. Sempre fora uma Rainha, uma Conquistadora de Corações, e por isto sabia reconhecer um Coração conquistado. E ela reconhecia agora, que seu próprio Coração fora irremediavelmente conquistado, e ela tinha medo. Ela temia pela segurança de um Reino, cujo Coração de sua governante agora dependia de um completo estranho.
- Eu sou Coração de Boneca, e procuro a Rainha de Espadas.
- Pois se procura a Rainha de Espadas, já a encontrou. – a Rainha retirou seu disfarce, e seus olhos derramavam Lágrimas que ela não podia conter. Algumas eram porque seu Coração pertencia ao Coração de Boneca, derramador das Lágrimas Eternas. Outras eram porque ela julgava-se derrotada de certa forma, acreditando que Coração de Bonecas havia viajado até o Reino de Espadas para conquistá-lo e para destroná-la. E, tendo seu Coração, isto não seria nenhum desafio. – E se é meu Coração que deseja, meu Reino que veio conquistar, então você já o tem. Você me venceu Coração de Boneca, e meu Coração agora é seu.
Coração de Boneca estava surpreso. E ele derramou Lágrimas, pois mais uma vez sua maldição o perseguia. Viajara tanto para buscar o Coração que sua Rainha precisava, e agora o Coração pertencia a ele. Mesmo assim, deveria levar o Desejo de sua Rainha.
- Eu não quero seu Reino e não quero nenhum Reino. Mas se o seu Coração foi conquistado, mesmo contra a minha vontade, então você atenderá meu pedido e virá comigo para o Reino de Copas, onde minha Rainha aguarda por você.
- Se assim você me pede, eu não posso negar. O Desejo de meu Coração é estar sempre ao seu lado. Mas eu espero que você não destrate o Coração que lhe foi entregue, e permita que depois de atender seu pedido eu retorne ao meu Reino, meu verdadeiro Lar, pois eu pertenço a este lugar e este lugar pertence a mim. Sem mim, os Corações de meus súditos sofrerão.
- Farei o possível para que você possa voltar para seu Reino, pois eu entendo bem o que é ter seu Coração distante do verdadeiro Lar.
A Rainha de Espadas e Coração de Boneca viajaram rapidamente para o Reino de Copas, nas carruagens da Rainha de Espadas. Durante a viagem eles puderam conversar muito, e a Rainha sempre insistia para que Coração de Boneca passasse a viver em seu Reino, ao seu lado. A Rainha de Espadas não tinha mais um Vazio, mas certamente não havia resolvido seus problemas. Estava agora, pela primeira vez, longe de seu Reino e seu Coração pertencia a alguém cujo Coração não pertencia a ela.

De volta ao Lar: Corações Entregues

A Senhora dos Farrapos sentiu um relampejo de vida voltar a brilhar nos frios corredores do Palácio de Cristal com a volta de Coração de Boneca ao Reino de Copas. Quando ele passou pela fronteira do Reino, a Rainha sentiu que ele se aproximava com o fragmento de seu Coração, e que ele trazia algo de sua Jornada. Ela sentiu um Coração Estrangeiro, e dentro dele havia ansiedade e angústia. Mas também havia alegria. No entanto, foi apenas no momento em que o Coração de Boneca colocou a Rainha de Espadas bem a sua frente, que a Rainha de Copas percebeu que, mesmo sem saber o que buscava, Coração de Boneca havia encontrado. Ela tinha algo que nem mesmo Coração de Boneca tinha, a Rainha de Espadas tinha o destino do Reino de Copas em suas mãos e nem sequer havia se esforçado para isto. O que a Rainha de Copas não sabia, é que aquele Coração já fora conquistado.
As Lágrimas que se derramavam pelo rosto da Rainha de Espadas eram cristalinas e puras, e prendiam em cada uma delas os Desejos da Rainha de Copas. Um Reino desconstruído se refletia nos gestos da Senhora dos Farrapos, um Reino que ambicionava trazer para si a vitalidade perfeita daquela Rainha. E a Rainha de Copas não hesitou ao ajoelhar-se diante da Rainha de Espadas e propor a união de seus Reinos. Mas em resposta, vieram apenas Lágrimas que a Rainha de Espadas havia juntado dentro de si. Ela não podia entregar seu Coração ou seu Reino para a Senhora dos Farrapos, pois eles nem ao menos pertenciam a ela verdadeiramente.
Os Reinos estavam separados. Um em ruínas, o outro perdido.

O Destino dos Corações: Sacrifícios e Ofertas

Mesmo sabendo o que lhe cabia fazer agora, e mesmo tendo se preparado durante toda a viagem de volta para fazê-lo, foi preciso uma noite a mais para Coração de Bonecas conseguir juntar a coragem para ir em frente até o fim, sem pensar mais no que poderia ter sido. Foi preciso assistir por mais uma noite sua Rainha, perdida em meio a um Reino desfeito. Foi preciso ver em seus olhos um Desejo que ardia, ver como ela precisava do Coração da Rainha de Espadas para reconstruir seus farrapos. Era um Desejo que ele conhecia bem, e ele sabia que só ele poderia garantir a junção dos Reinos. E foi então que, quando a Rainha de Copas finalmente conseguiu livrar-se de suas angústias e cair em um sono perturbado, Coração de Boneca foi até o Espelho das Almas fazer sua oferta.
Ninguém vive sem um Coração. Coração de Boneca não era uma exceção, e ele sabia disto. Mas ele sabia também que o Coração da Rainha de Espadas seguiria o seu, onde quer que ele fosse. Ele sabia que, quem quer que possuísse seu Coração, teria também o da Rainha de Espadas. E, com a ajuda do Espelho das Almas ele conseguiu cumprir seu objetivo. Antes do amanhecer, Coração de Boneca havia arrancado seu próprio Coração e ele era agora o segundo Coração da Rainha de Copas. Mas, ao contrário do que pensava, Coração de Boneca sobreviveu. Ainda havia restado para ele o fragmento do Coração que a Rainha de Copas lhe havia entregue. Ele pulsava, dentro de seu peito, mantendo-o ainda vivo. E, sendo o Coração de uma Rainha, entregue por vontade própria, ele foi suficiente para manter Coração de Boneca. Agora ele não era mais Coração de Boneca, pois este Coração era da Rainha de Copas. Ele era apenas um pedaço, ele era apenas Fragmentos de Copas.

Reinos Unidos, Farrapos Eternos

Possuindo o Coração de Boneca, a Rainha de Copas era também Senhora do Coração da Rainha de Espadas, que havia conquistado seu Coração de Copas. Os seus Reinos, tal como seus Corações, juntaram-se para formar o maior Reino já visto, sob o comando das duas Rainhas que fortaleciam-se unidas.
Fragmentos de Copas viveu neste novo Reino, como um herói que entregou seu próprio Coração para a Rainha de Copas. Ele não mais tinha um Coração de Boneca, nem derramava suas Lágrimas Eternas. Ele vivia agora dos fragmentos do Coração da Rainha, ele alimentava-se do que ela era. Sua vida era um pedaço da vida dela.
A Rainha de Copas reconstruiu seu Reino. Ela tinha tudo a seus pés, e conquistaria ainda muitos Corações. Ela sabia o que Coração de Boneca havia feito por ela, ele havia oferecido tudo o que ele era. E ele era, em última instância, o reflexo de tudo o que a Rainha de Copas havia conquistado e erguido, de tudo o que ela era e governava. Nunca nenhum outro Coração havia sido conquistado daquela forma, e a servido de maneira tão dedicada e incondicional. Por isto, ela olhava para ele como se ele fosse, de algum modo, tudo o que ela verdadeiramente possuía. Afinal, o Coração de Boneca que agora batia em seu peito, era mais próximo até mesmo do que o Coração conquistado da Rainha de Espadas. E nada poderia substituir a entrega que lhe fora feita por Coração de Boneca, nada poderia substituir suas Lágrimas Eternas que moravam dentro do seu peito. E ele era agora Fragmentos de Copas. Ele era em pedaços, pedaços dela própria. Ele era os farrapos do que fora e do que havia entregue; ele era os farrapos do Coração da Rainha de Copas. De uma maneira ou de outra, a Rainha de Copas eternamente seria a Senhora dos Farrapos. E Coração de Boneca estaria sempre com ela.

quinta-feira, janeiro 29, 2004

Sexto Post:

Poder e Ambição: Conquistas na Morada dos Desejos

Algum tempo antes da chegada do viajante, ela já estava lá a sua espera. E quando ele colocou seus pés cansados da longa jornada pela primeira vez na Morada dos Desejos, sem nem ao menos saber onde entrava, o mundo inteiro pareceu condensar-se por um momento naqueles lábios rubros que se incendiavam na face pálida da Rainha de Ouros, parada bem à sua frente. Imediatamente, ele sentiu algo dentro de seu Coração, algo que o assustou, mas que também lhe causou uma admiração inexplicável. A Rainha de Ouros não perdia tempo, e já estava bem preparada para tentar aprisionar aquele Coração antes que a oportunidade fugisse entre seus dedos. Mas a verdade é que, de tudo que ela houvesse imaginado que encontraria ali na Morada dos Desejos, nada se comparava ao Coração de Bonecas. Apesar de manter sua pose impassível, por dentro ela reconheceu que se encontrava diante de um poder singular, dentro de uma criatura tão pequena, tão simples. E seu desejo por ele aumentou ainda mais. Ela queria ter todas aquelas Lágrimas e aquele Coração humilde sob seu comando, a seu serviço e às suas ordens. E queria que ele lhe fosse entregue por vontade própria, pois sabia que só assim o possuiria verdadeiramente.
A Rainha esperou alguns minutos em silêncio, enquanto via Coração de Boneca parado, olhando fixamente para ela, claramente confuso e assustado. Ela usou estes minutos, (se é que se poderiam chamar de minutos em um lugar como a Morada dos desejos, onde o Tempo não existe) para estudar bem a situação. Coração de Boneca lhe parecia a mais transparente das criaturas, com um óbvio desejo latente em cada gesto e intenção sua de completar uma missão ridícula e ingênua. Ele era simples e manipulável como um pequeno animal, contanto que acreditasse estar cada passo mais próximo de atingir seus simplórios objetivos. Mas a Rainha também sentiu uma ponta de ódio dentro de si, quando viu que além das intenções óbvias que estavam estampadas nele, o seu poder tornava seu Coração protegido de investidas poderosas e diretas; suas Lágrimas eram um escudo contra a hostilidade e a sedução da Rainha de Ouros, e ela soube que teria de usar outras formas de atingí-lo, especialmente as palavras. E depois de julgar que o recém-chegado estava bem confuso, debatendo-se em sua teia, a Rainha achou que era hora de aproximar seu ataque.
- Você veio do Reino de Copas não é mesmo?
O tom cuidadoso usado nas palavras era um perigo à parte, com a voz perfeita, aveludada da Rainha de Ouros, que penetrava e corria em direção ao Coração, apertando-o e envolvendo-o. Coração de Bonecas engoliu em seco, tentou responder duas vezes antes que pudesse finalmente encontrar uma voz tímida dentro de si e colocá-la para fora em algumas palavras bobas e desajeitadas.
- Vim. Quem é você? Que lugar é este? E como você sabe de onde eu vim?
- Eu sou a Rainha de Ouros, e você está na Morada dos Desejos. Não são muitos que conseguem chegar até aqui, sabia? Eu mesma tenho grande dificuldade de vir até a Morada, mas eu sabia que te encontraria aqui e resolvi me arriscar na jornada. Achei que valeria a pena, e espero que eu não tenha me enganado quanto a isto. – fez uma pequena pausa, olhando calculadamente de cima a baixo Coração de Boneca, com um olhar malicioso de desejo e uma pontada de desprezo fingido. – Sabe, eu detesto me enganar. E você já chega aqui subestimando meus poderes, acreditando que eu não perceberia algo tão simples quanto o fato de você ter vindo do Reino de Copas. Ora, as marcas da Rainha estão impressas em toda parte em você, em seu Coração tolo que está obviamente a serviço dela, tentando cumprir alguma missão que ela própria não teria coragem de realizar. Além disto, de que outro Reino poderia ter vindo uma criatura que derrama Lágrimas o tempo todo? –Seu sorriso abriu-se numa ligeira risada. – É tão típico da Rainha de Copas ter algo assim em seu Reino.
Coração de Boneca queria interrompê-la, dizer as coisas certas na hora certa, e defender sua Rainha que ele acreditava estar sendo insultada. Mas ele apenas permaneceu calado ouvindo a Rainha de Ouros terminar de falar.
- E vejo que você não é um emissário ou viajante qualquer. – sua expressão agora carregava uma ponta de surpresa e inveja, um olhar intimidador que parecia querer invadir o Coração de Boneca e lhe roubar algo lá dentro. E ele quase conseguia. – A Rainha deve confiar muito em você, para ter lhe entregue um pedaço de seu próprio Coração. Mesmo uma Rainha tão tola e ingênua quanto a Rainha de Copas sabe que não se faz tal coisa levianamente, que isto implica em grandes perigos. – A Rainha sentiu então que era hora de uma provocação mais contundente, ela precisava incitar emoções fortes no Coração daquele jovem tolo para poder conduzí-lo mais facilmente. Sempre usava emoções fortes como suas armas, os Corações ficam muito mais vulneráveis quando inebriados por uma paixão. Tornam-se cegos e imprudentes, prontos para uma boa armadilha. – Mas, pensando bem, talvez ela não confie tanto assim em você. Eu posso ver que você não possui inteiramente o Coração da Rainha de Copas. Seria você muito fraco para suportar o Coração de uma Rainha? Ou apenas incompetente para conseguir conquistá-lo? Por que, me diga, você não conquistou o Coração da Rainha? Mesmo tendo você entregado seu Coração cheio de Lágrimas ela não sentiu que poderia confiar em você? – permitiu-se uma pequena risada, sentindo que o Coração ao qual falava se enchia de emoções conflitantes, e que ela conseguira perturbá-lo exatamente como desejava. – Provavelmente ela apenas lhe deixou este pequeno pedaço para convencê-lo a se arriscar em alguma missão que sabia ser extremamente perigosa. Ela deve estar apenas lhe usando para conseguir alguma coisa a mais para enfeitar seu Reino de Copas. Apenas um brinquedo a serviço da vaidade de uma Rainha, mais um Coração perdido e ingênuo em meio aos seus súditos, que acredita um dia poder ser mais do que um servo. Pobre coitado, deve ter alimentado a ilusão a cada passo desde que saiu do Reino de Copas, de que voltaria com o que a Rainha lhe pediu e que finalmente conquistaria seu Coração.
Coração de Boneca não conseguia deixar de concordar com algumas coisas que a Rainha de Ouros falava. De algum modo, mesmo sem nunca ter conhecido ele, ela havia acertado um ferrão certeiro sobre suas maiores inseguranças. Obviamente ele não acreditava que a Rainha de Copas estivesse usando-o e manipulando daquela forma, mas muitas vezes ele realmente se sentia como se estivesse lutando inutilmente para pertencer à Rainha, para ter algum pedaço mínimo do Coração dela e ser algo que nunca poderia. Às vezes ele se flagrava agarrando-se à ingênua esperança de que poderia ter o Coração da Rainha para si, que poderia transformar as coisas. Mas ele sabia que não, e por isto as duras palavras da Rainha de Ouros rasgavam-no por dentro. Mas ele tinha a certeza de que seus medos deveriam pertencer apenas a ele próprio, e que ele não podia deixar uma desconhecida insultar sua Rainha desta forma. Além disto, ele ainda possuía um fragmento do Coração da Rainha de Copas. E isto era o suficiente para que ele conseguisse continuar em frente.
- Da mesma forma que entreguei meu Coração à Rainha de Copas por minha própria vontade, eu venho nesta missão com meus próprios motivos. A Rainha jamais me mandaria em alguma missão por vaidade, e se você tem coragem de dizer algo assim é porque desconhece o Coração da governante do Reino de Copas. Por isto, eu lhe digo que pare de ofender minha Rainha e deixe-me continuar em minha missão.
A Rainha de Ouros estava verdadeiramente admirada com Coração de Boneca. Agora admitia para si mesma, e apenas para si mesma, que em sua primeira impressão o havia subestimado. Enquanto ele lhe dizia aquelas palavras cheias de ódio e de determinação, enfrentava uma Rainha cara a cara sem hesitar, seus olhos não paravam de derramar Lágrimas. Por mais que ele não tivesse seu Coração cheio de certeza, ele o tinha repleto de determinação para enfrentar suas dúvidas. Ela não o venceria pelo medo. Ela poderia o derrotar facilmente, mas não era isto que desejava. A Rainha de Ouros tinha consigo mesma uma norma de conduta, de um modo bem particular, que não desrespeitava, apesar do que pudessem pensar todos os outros a respeito de sua integridade, e atacar Coração de Bonecas para derrotá-lo era algo que ela não faria. Mas ela não desistiria tão facilmente de conquistar seu Coração e tirá-lo da influência da Rainha de Copas.
- Alguma vez você já enxergou dentro de si mesmo? Eu enxergo seu Coração, e posso ver que ele é delicado e vulnerável. Mas eu também consigo enxergar o poder dentro dele. Um poder que você mesmo parece desconhecer. Eu sei que você colocou este poder nas mãos da Rainha de Copas, mas também sei que é capaz de retirá-lo, e que é capaz de conquistar milhares e de erguer Palácios com a força que há nele. – a Rainha de Ouros sabia que era inútil um confronto dissimulado, ela decidiu retirar suas máscaras. – Fique ao meu lado Coração de Boneca. Junte-se a mim em meu Reino, e eu lhe entregarei tudo o que a Rainha de Copas jamais lhe dará.
- Agradeço sua oferta, mas meu Coração já encontrou seu Reino, e minhas Lágrimas já foram secadas. As mágoas que carrego dentro de mim não são todas minhas, e eu caminho agora para poder apaziguá-las e retornar para o meu lar. Eu sei que eternamente buscarei por algo que não será meu, mas eu ao menos sei onde posso encontrar isto. Meu Coração, agora e sempre, pertence à Rainha de Copas, e esta escolha não é minha e não sou eu quem pode desfazê-la. Eu posso, sim, ver dentro de seu Coração também Rainha de Ouros, e sei que você também busca. Seus olhos não têm Lágrimas e sua força é maior do que a minha, mas ainda assim você busca como eu. Nossos Corações são outros, e você é a governante de seu Reino, onde todos os Corações te pertencem e te adoram. Sua busca, como a minha, é eterna, e isto nós temos em comum. Se você partiu de seu Reino e veio até a Morada dos Desejos buscando o que falta em seu Coração, eu espero que você encontre o quanto antes. Apenas lamento que não possa lhe ajudar, pois você veio aqui atrás de meu Coração, que é um Coração conquistado. E, se existe mesmo este poder em meu Coração que você diz e que eu sou incapaz de perceber, ele será então suficiente para que você me deixe. Ele servirá para que seus truques não sejam suficientes para me fazer esquecer que o meu Coração não pertence a mim mais do que ele pertence à Rainha de Copas. Você é uma Governante, e sua ambição é imortal. Eu não desejo Reinos ou poder, tudo o que eu desejo é reconstruir o que foi partido no Coração de minha Rainha.
A Rainha de Ouros sabia que era inútil. Sua frustração latejava em seu peito querendo dar vazão na forma de um ódio destrutivo, que acabasse de uma vez por todas com aquele Coração que ela não conquistaria, como se ele nunca houvesse existido. Mas nem isto ela pôde, pois desta vez ela havia sido derrotada. O seu Coração não fora conquistado e nem seu Reino perdido, mas ela sabia que era apenas porque Coração de Boneca não desejava isto. O que ela pensava que seria apenas mais uma simples conquista para a perfeição de seu Reino, revelava-se uma humilhante derrota na qual ela seria poupada. E ambos sabiam que ela poderia derrotar e esmagar Coração de Boneca em um piscar de olhos, se assim quisesse seu ganancioso Coração de Rainha. Mas a sua derrota era exatamente esta: ela não queria esmagar o Coração de Boneca. A Rainha, apesar de orgulhosa, sabia ser sensata quando era necessário.
- Muito bem Coração de Boneca, você tem minha permissão para continuar em sua missão em nome do Reino de Copas. O futuro é longo e os Corações mudam. Um dia nos reencontraremos, quando o Reino de Ouros for ainda mais poderoso, e meu Palácio será a verdadeira Morada dos Desejos. Até lá, persiga os Desejos de sua Rainha. Eu mesma guiarei seu Coração através deste lugar para que você encontre o que busca.
Coração de Bonecas deixou a Rainha de Ouros para trás com uma reverência, e alguns passos depois já não sabia se havia permanecido por alguns minutos ou por muitos anos na Morada dos Desejos. Mas ele soube que havia encontrado o que procurava, quando sentiu dentro de si o fragmento do Coração da Rainha de Copas agitar-se. E, dentro das névoas que envolveram seus pensamentos, Coração de Bonecas viu um lugar distante. Foi a Rainha de Ouros, ainda guiando-o em seus pensamentos, que lhe instruiu sobre sua visão. Os jardins perfeitos e o Palácio que se estendiam nos seus sonhos pertenciam a outro Reino. Eles eram o domínio da Rainha de Espadas, e os Desejos de sua Rainha buscavam por aquele lugar. Era lá o próximo destino em sua busca.

segunda-feira, janeiro 26, 2004

Quinto Post:

Espelho das Almas: Coração Solitário

Desde que Coração de Boneca havia partido, as coisas pareciam piorar cada vez mais para a Rainha de Copas. Era como se a única viga ainda confiável que sustentava uma velha mansão tivesse sido removida. E agora, a casa parecia pronta para desabar a qualquer momento.
A cada dia a Rainha duvidava mais de si mesma. Aquele Reino era mesmo seu? Já não conseguia pensar que sim. Tinha ódio de si mesma, por ser uma Rainha incapaz de governar e por ter deixado partir o mais belo Coração de seu reino em uma missão incerta e perigosa, uma jornada inútil com o objetivo de reconstruir algo que já estava perdido. Era uma busca fadada ao fracasso, e ela havia deixado Coração de Boneca partir nela.
Mesmo depois de conhecê-lo tão bem e tão intimamente, ele conseguia intrigar a Rainha. Por que ele perdia seu tempo tentando ajudar a Senhora dos Farrapos, ao invés de criar seu próprio Reino, que certamente seria um dos mais belos já vistos? Como alguém tão especial não conseguia enxergar o óbvio diante de seus olhos, enxergar que não havia mais nada a se fazer por um Coração Vazio como o dela, por uma Rainha que nada tem? Mas...na verdade ela tinha algo ainda. Ela ainda tinha um Coração que lhe fora dado, e isto ainda a mantinha em pé, dentro do seu Palácio de Cristal. E permaneceria lá, com o Coração que lhe fora entregue, até que seu dono retornasse.
Naquela noite, não agüentando mais a angústia da espera solitária, a Rainha decidiu visitar o Espelho das Almas, escondido no canto mais remoto de seu Palácio. E, de frente para o Espelho, olhou firmemente para dentro dele e encarou seu rosto. Era uma colcha de retalhos. Seus olhos a lhe encarar com compaixão e tristeza, sem inspirar a admiração incondicional de outrora. De um jeito ou de outro, as Rainhas sobrevivem de admiração e amor. Elas sobrevivem dos Corações Conquistados. E a Rainha de Copas olhava para si mesma e tinha a certeza plena de não poder conquistar um Coração, de que não havia nada nela que pudesse garantir a admiração de alguém e, portanto, a integridade de seu Reino e de si mesma. Mas havia algo que contradizia isto, algo que escapava ao seu entendimento. Porque ela sabia que tinha um Coração que era seu, que a admirava e a amava. E ela via o reflexo disto no Espelho das Almas, perdido naquele semblante refletido.
Olhando naquele Espelho a Rainha enxergou dentro de seu Coração em Farrapos. E ela conseguiu ver coisas sobre o Coração de Boneca também, pois ela possuía seu Coração. Por que, ela perguntou ao seu reflexo, ter um Coração como aquele não era suficiente para reconstruir seus Farrapos? Por que ela não podia entregar seu Coração a ele por inteiro, como ele havia feito, e reconstruir tudo ao seu lado? Por que, apesar de tudo, lhe faltava um pedaço? De onde vinha aquele Vazio, como poderia preenchê-lo?
E o Espelho das Almas, refletindo a Rainha, respondeu como pôde. Havia uma coisa irônica no que a Rainha sentia por Coração de Boneca. Era como se, por ter ele entregue seu Coração a ela, a sua admiração perdesse um pouco do valor. Para a Rainha era como se aquela admiração que ele tinha por ela fosse apenas porque ele havia entregado seu Coração. Se você interrogasse Coração de Boneca, no entanto, ele lhe diria exatamente o contrário: Ele havia entregado seu Coração pois nunca antes havia encontrado alguém que admirasse e amasse tanto, e pela primeira vez ele pôde fazer isto. E finalmente havia descoberto que era por isto que ele buscava sua vida inteira.
A Rainha podia entregar seu Coração a ele, como ela havia feito, mas havia um pedaço do Coração dela que permanecia intocado, quiescente, imaculado, sozinho. E tanto ela como Coração de Boneca sabiam disto, e foi por este motivo que Coração de Boneca partiu. Ele percebeu, antes mesmo da Rainha, que sem poder entregar aquele pedaço ela nunca poderia se reerguer. Ela precisava de algo que trouxesse nova vida ao seu Coração, ao seu Reinado. Mas nem mesmo na profundidade do Espelho das Almas a Rainha conseguiu enxergar o que era aquilo que faltava.



Distância: Coração Incerto

Muitas vezes era difícil para Coração de Boneca seguir em frente. Ele estava sozinho, e a cada passo mais longe do Reino de Copas e da Rainha a quem seu Coração pertencia. Apesar de sentir cada dia de jornada aproximando-o de seu destino, ele ainda não sabia para onde rumava e nem o que procurava. Ele sentia falta da Rainha de Copas ao seu lado.
Por mais que soubesse ter conseguido algo da Rainha de Copas que nunca ninguém havia conseguido, às vezes, nos piores momentos, Coração de Boneca não pensava tanto nisto. Ele conseguia apenas pensar que o Coração da Rainha de Copas, pelo qual ele daria todos os Reinos do mundo, não era inteiramente seu. E ele sabia que, quanto mais se aproximasse do que estava procurando nesta jornada, mais estaria se aproximando daquilo que lhe afastaria ainda mais da Rainha. Ele buscava um guardião para aquele Coração Vazio, alguém que pudesse ser melhor do que ele nesta difícil tarefa.
Ele continuava em frente, sempre se apoiando naquele pequeno pedaço do Coração da Rainha de Copas que pertencia a ele. Aquele era seu guia e protetor, e apenas por que o possuía Coração de Bonecas conseguiu ir além do que seu próprio Coração permitia.

Corações Unidos: Novas Esperanças

O Bobo de Copas apenas observava de longe. Ele sabia bem de tudo o que acontecia, desde o Reino de Copas até onde a imaginação se deita. Era só o que ele fazia, observar aqueles Corações. E ele via todo o desenrolar do encontro de dois Conquistadores de Corações tão perdidos: uma Rainha que não conseguia governar, e um Rei que não queria um Reinado.
Na verdade, ele via as coisas de uma maneira bem diferente. Ao contrário do que todos pensariam, logo na primeira vez que ele viu Coração de Boneca, ainda com suas eternas Lágrimas a escorrer incessantemente, ele soube que ele não deveria ter um Reino para si. Existem muitos jeito de se conquistar Corações, e a maioria das pessoas fecha seus olhos para isto. Mas o Bobo de Copas via claramente na sua frente todas as diferenças, como um caçador experiente que distingue as pegadas, cheiros e barulhos de suas presas. Era algo, ele sabia, que mesmo para as Rainhas era difícil de se fazer. Talvez apenas a Rainha de Ouros o superasse nesta habilidade, mas mesmo assim sua visão distorcida por uma ambição incontida lhe fazia perder detalhes sutis e de grande importância.
O Bobo de Copas viu que o talento para conquistar Corações de Coração de Boneca era bem diferente daquele que teria qualquer Rainha. Muitas vezes ele nem percebia este seu poder, e nas outras, Coração de Boneca não se esforçava para conquistar nenhum Coração, e muitas vezes até considerava uma maldição para si mesmo ver aqueles Corações sendo entregues a ele a contragosto. Corações que ele desconhecia, que ele não queria. Ter um Coração Conquistado era uma responsabilidade. Ele sabia que era preciso cuidar dos Corações de seus súditos, que era preciso alimentar seus sonhos, que era preciso retribuir de alguma forma. Ele não servia para isto, e considerava-se um Destruidor de Corações muitas vezes, que destruía sem querer, e sempre querendo livrar-se deste fardo. Outra coisa que o Bobo de Copas viu nas Lágrimas de Coração de Boneca era que algumas delas não eram apenas dele. Os Corações que ele conquistava mesmo sem querer, lhe traziam as dores deles. Dores que se transformavam em Lágrimas nos seus olhos.
Coração de Boneca muitas vezes desejava fugir de si mesmo, que seria o único jeito de libertar-se disto. Ele imaginava o Reino que sempre lhe disseram que deveria ter, como um lugar onde todos sempre derramariam Lágrimas eternas como ele. Seria um reino de dor e de tristeza, que era a sina de todos aqueles que lhe entregavam seus Corações. Ele acreditava que todos consideravam aquilo um dom, apenas porque não tinham experimentado por si mesmos esta desgraça.
Mas isto tudo fora antes. Antes dele chegar ao Palácio e do Bobo de Copas enxergar dentro do seu Coração. Antes que aquele Iluminador de Corações, tão bem escondido como um mero bufão da Rainha, percebesse que aquele derramador de Lágrimas não estava lá por acaso. Não era um Reino que Coração de Boneca precisava, ele precisava conhecer o Coração da Rainha de Copas. O Coração que estava se transformando em farrapos, e que apenas alguém como ele teria alguma chance de remendar.
O Bobo acompanhava o Coração da Rainha há muito tempo. Assistiu preocupado o Reino dela transformar-se, passando da alvorada ao crepúsculo. Viu a Rainha fechar-se, como uma flor que murcha, com suas pétalas perdendo as cores, e suas folhas caindo como a esperança que foge de seu Coração. Viu seus súditos acompanharem as mudanças sem nem ao menos se darem conta disto. Era outono no Reino de Copas, e as folhas começavam a secar e cair da árvore. Ele viu isto tudo, impotente.
Um dia ele encontrou Coração de Boneca, e soube que o Destino finalmente resolvera dar uma nova chance ao Reino. Ele cumpriu sua pequena parte e voltou a observar. Ele viu o encontro de dois Corações tão únicos, que de perto não conseguiram enxergar tão bem quanto ele a beleza daquele encontro. Era como se um único Coração há muito tempo partido houvesse finalmente juntado suas metades. E, mesmo sabendo que não seria tão simples assim as coisas se acertarem no Reino de Copas, o Coração do Bobo ficou mais leve pois ele viu o sorriso quase perdido da Rainha abrindo-se nos dias que se seguiram à chegada do Coração de Boneca. Ele sabia que o Coração da Rainha pertencia muito mais àquele recém-chegado do que ele pensava. E ele sabia que a Rainha era muito mais capaz de governar do que ela pensava. Era só uma questão de tempo até que eles percebessem isto e as coisas se acertassem. Ele viu confiante a partida de Coração de Boneca. Sabia que tudo daria certo quando ele retornasse.

sábado, janeiro 24, 2004

Quarto Post:

Remendos de Copas: Corações Guardados

A Rainha de Copas não se esquecia da primeira vez em que havia visto Coração de Boneca. Ela viu seu rosto marcado de Lágrimas se transformar, assistiu um sorriso nascer naquele semblante tristonho. Era um sorriso como ela nunca vira antes, e ela sabia que era responsável por aquilo. Ela, que era uma Rainha que não sabia mais governar, que tinha um Reino a seus pés e um vazio em seu Coração, que não passava de uma Senhora de Farrapos, havia conseguido secar as Lágrimas eternas do Coração de Boneca. E saber disto foi bom para a Rainha. Sendo a mais sensível das Rainhas, ela entendia muito bem o alcance das Lágrimas ou Sorrisos do Coração de Boneca. Qualquer um poderia compreender que ele era, querendo ou não, um Conquistador de Corações. Mas a Rainha de Copas viu mais do que isto. Ela viu coisas ocultas dentro daquele Coração, que nem o próprio Coração de Bonecas sabia que estavam lá. Ela viu um poder que despertaria a inveja e a ambição da mais poderosa Rainha, mas que suscitou uma grande admiração no Coração da Rainha de Copas. E, ver como Coração de Boneca usava aquele poder, sem ambição ou vaidade, despertou um afeto sincero e profundo por parte da Rainha.
Perceber que, mesmo julgando-se uma Rainha triste e incapaz, ela havia conseguido transformar aquele Coração tão lindo e único de uma maneira tão intensa, trouxe uma maravilhosa fagulha de esperança ao Coração da Rainha. Uma esperança que ela precisava ter. E ela soube que a partir daquele momento havia conquistado aquele coração, e que ele passara a depender dela. Ela não sabia como ou porque havia conquistado, mas isto não mudava a enorme devoção de Coração de Boneca.
E ela desejou que aquilo fosse suficiente. Desejou transformar aquela gratidão, admiração, afeto por Coração de Boneca em algo ainda maior, e lhe entregar seu Coração da mesma forma que ele havia feito. Queria poder fazer isto, preencher o Vazio em seu Coração, e secar suas Lágrimas. Queria, por este momento, deixar de ser a Senhora dos Farrapos. Mas ela não pôde. E ela também desejou que o Coração que lhe fora entregue fosse suficiente para ela se sentir novamente como uma Rainha, para que ela soubesse que era capaz de governar o Reino de Copas e que ela soubesse que era capaz de alguma coisa. Mas de alguma maneira ela enxergava Coração de Boneca como alguém que se iludia, vendo uma Rainha onde não havia mais nada. Apenas ele enxergava a Rainha que não estava lá, enquanto o mundo a sua volta sabia que ela não era mais nada, que ela não podia nem ao menos governar a si mesma.
Coração de Boneca remendava os Farrapos, mas era incapaz de reconstruí-los.

Corações Errantes: Jornadas Incertas

Às vezes queremos que o tempo pare e nos deixe em paz com um momento perfeito que encontramos em algum canto perdido. Nestas horas é que ele corre sem nos avisar, nos deixa pra trás meio perdidos. O tempo passou assim para Coração de Boneca. Cada dia que ele visitava a Rainha e conseguia lhe arrancar um sorriso, ele queria poder guardar como um talismã imaculado dentro de seu Coração. Ele esquecia, e a Rainha também, das Lágrimas e do Vazio que se estendiam pelo Reino de Copas. Mas sempre havia uma hora em que eles voltavam, dizendo sempre ao Coração de Bonecas que ele devia partir. Dizendo para ele fazer o que ele já sabia que deveria fazer. Mas ele queria adiar este momento para sempre, com medo de perder o que havia conquistado.
Os dias transformaram-se em semanas, e as semanas em meses, sem que Coração de Boneca se desse conta disto. Até que ele percebeu que não podia mais deixar sua Rainha daquele jeito, e que tinha que partir naquele mesmo dia, para voltar apenas se conseguisse aquilo que buscava, que novamente ele não sabia o que era. Ele tinha medo, mas ele arrumou suas coisas pra partir. Ele tinha medo, mas foi aos aposentos da Rainha sem um pingo de hesitação para lhe comunicar sua partida.
A Rainha de Copas viu sua esperança parada bem na sua frente, dizendo-lhe que iria partir. Mais uma vez, Coração de Boneca faria por ela o que ninguém mais faria. E ela também teve medo, de deixar partir o resto de suas esperanças e de perdê-lo para sempre. Ela quis lhe perguntar porquê ele partia. Mas ela já sabia a resposta e calou-se. Ela quis lhe pedir para não ir. Mas ela já sabia que não adiantaria e calou-se. Ela quis lhe dizer palavras que lhe dessem coragem e que o ajudassem. Mas ela sentiu que suas palavras seriam vazias perto das Lágrimas que escorriam em seu rosto. Então ela resolveu dar a Coração de Boneca a única coisa que poderia para ajudar-lhe em sua viagem. Delicadamente aproximou seu rosto do Coração de Boneca e seus lábios se tocaram suavemente. Ela deu um pedaço de seu Coração para Coração de Boneca. Um pedaço que na realidade ele já possuía, desde seu primeiro encontro, mas que só agora lhe fora verdadeiramente entregue. Um pedaço do Coração da Senhora dos Farrapos, um Coração que nunca seria inteiramente dele. E deixando algumas Lágrimas com a Rainha, Coração de Boneca partiu, levando consigo todas as esperanças da Senhora dos Farrapos.
A Rainha de Espadas não sabia mais o que fazer. Dividida entre o controle de um Reinado sublime e a busca inatingível por alguém a quem pudesse entregar seu Coração, ela sentia uma incerteza que não gostava de admitir para si mesma. Afinal, ela era uma governante de muitos Corações e deveria permanecer calma e segura de si mesma. Mas era cada vez mais difícil para a Rainha ignorar que seu Coração precisava encontrar um lugar para si, precisava pertencer a alguém. Apesar de ser um pouco orgulhosa demais para considerar esta possibilidade como algo agradável, ela começava a sentir que devia realmente procurar por isto. E sabia que a resposta não estava dentro do seu Reinado.
Uma Rainha nunca atravessa levianamente as fronteiras de seu Reino, deixando para trás os Corações de seus súditos. Mas a Rainha de Ouros sempre foi ousada, e saiu de seus domínios para ir de encontro à mudança. Ela seguia obstinada, tendo a certeza de que se aproximava cada vez mais de seu objetivo. Ele estava ali em algum lugar, e era algo poderoso.

Morada dos Desejos: Encontros Inesperados

Onde quer que os Corações acreditem que é o centro do mundo, este será o lugar certo.
Longe de todos os Reinos, além dos portões e dos muros, além dos vales, colinas e florestas e rios, além dos dias e das noites, dos crepúsculos e das alvoradas, existe um lugar. Neste lugar, onde todos os Corações são Reis e Rainhas mas nenhum deles governa, os Desejos se materializam em um poder ilimitado.
Na Morada dos Desejos, o Tempo não existe, e o solo é virgem como um botão de rosa. Sonhos ousados perambulam ao redor deste lugar, e os Corações tão próximos e distantes, abastecem-no infinitamente com Desejos. Desde os mais ambiciosos Desejos de poderosas Rainhas há muito perdidas, até as mais simples vontades de um Coração ingênuo: todos os Corações habitavam a Morada dos Desejos, sem nem ao menos saberem disto.
Bem no fundo de todos os Corações, sempre existem Desejos secretos. E todos os Desejos existem na Morada dos Desejos, onde um encontro estava para acontecer.