sexta-feira, setembro 24, 2021

 Mais um dia em que não vivi

quinta-feira, setembro 23, 2021

 K. conta a história de um pai em busca de sua filha, desaparecida e assassinada pela ditadura.

Às tantas, uma amante de um torturador oferece suas informações. Ela fala sobre ter se apaixonado por um torturador, o que ocorreu quando foi pedir um passaporte falso para salvar o irmão, Zinho, militante perseguido pela ditadura.

"Mas o que importa é que virou paixão. E aí não interessa se o cara é um bandido, se é casado ou solteiro, ou o que seja; não sei se a senhora já viveu uma paixão, se a gente nega, ela só aumenta, vira doença, arrebenta com a gente.

[...] O crime não é se apaixonar, o crime é se negar, um crime contra si mesma"

Há muitos crimes em se apaixonar. Contra si mesmo e contra os outros. Às vezes nossa paixão é um crime contra a pessoa por quem nos apaixonamos; contra quem amamos. É sem saída. Ela diz, no romance, que se nega, ela vira doença e arrebenta com a gente. E diz, também, que ter vivido essa paixão a tornou um monstro para os que a amavam.

"Já estou queimada mesmo, repudiada pelos meus irmãos, sem poder ver meus sobrinhos; marcada como se fosse com ferro quente na testa, como se marcam as ancas do gado no Paraná. Essa marca vai ficar para sempre. Assim como a senhora vai carregar a sua dor até o dia em que morrer, eu também vou carregar essa marca até o dia em que morrer. Meu consolo é que eu salvei Zinho."

Não há saída. Eu vivo em pedaços.

terça-feira, setembro 21, 2021

 Vivo um tempo estagnado, que não passa

em meio ao lixo, a escombros, nem sei como acordo, como vou dormir. Nem lembro do que foi, nem penso no que vai ser. Apenas acordo, faço, durmo.

Aqui transbordo, pelo menos um pouco. Deixo escorrer em palavras um pouco do que me consome.

E volto.

Penso no que fiz, se poderia ter feito algo. Penso em quem perdi. 

Penso que não vale a pena seguir, mas não posso não seguir. Me sinto endividado. Finjo que dá, e continuo.

quinta-feira, setembro 16, 2021

Mensagem em uma garrafa

Não sei se me lê.

Não há outra forma possível de dizer, mas não há como não dizê-lo.

A cada dia me dói como uma ferida aberta e gangrenante o peso de minhas ações.

Expressa-o bem o fato de que em meio a um mundo cada vez mais obscurantista, autoritário

No qual as pessoas que admirava e com as quais contava sucumbiram sem hesitação às mentiras

E em um momento em que vejo a medicina assassinar lentamente uma das pessoas que mais amo.

Com frequência me pesa mais do que tudo isto a dor das ações estúpidas que cometi.


E, no entanto, minha covardia me soterra, me emudece.

Minha vergonha é o manto que me cobre.

Eu me envergonho diante de mim

E me calo.


Só nessa garrafa digo de minha dor

e a lanço ao mar do silêncio.

terça-feira, setembro 14, 2021

 Há um buraco negro em meu estômago

pra onde vai o ar que não passa por minhas cordas vocais



quarta-feira, setembro 08, 2021

Se eu partir

Se eu partir há muito que ficará não dito

na minha cabeça, palavras ressoam,

frases não feitas, rumores

pedaços de vida desencarnados


Se eu partir não os levo comigo

deixo-os suspensos

em um tempo de não existência


Se eu partir há muito que ficará incompreendido

dessa avalanche de tristezas, amores

escombros


Se eu partir eu deixo a herança

da desilusão

da desesperança