quinta-feira, outubro 04, 2012

A greve dos "quarteirizados" da Façon


 
Na terça-feira estive no galpão da companhia Alstom, companhia contratada pelo metrô de São Paulo como "parceira" na expansão do metrô. Para quem não sabe, a Alstom está envolvida em um escândalo de propinas nas licitações do metrô, um caso bastante exemplar de como funciona a democracia dos ricos, na qual o transporte público é um lixo para a população em nome de garantir os interesses dos polpudos lucros das empresas.
A Alstom contrata empresas terceirizadas para suas obras; uma destas é a empresa Façon, cujos trabalhadores estão há dois meses sem receber salários e há um ano sem o pagamento de seus direitos, como INSS e FGTS. A empresa declarou falência, alegando não poder pagar, diante do que os trabalhadores entraram em greve e ocuparam um galpão com materiais da Alstom. Para quem acompanhou a greve dxs terceirizadxs da União no ano passado na USP, ou o conflito da BKM, ou inúmeras outras lutas de terceirizados que se desenvolveram na universidade com o apoio ativo do Sintusp, a manobra da Façon não é novidade: os patrões, além de ignorarem direitos elementares dos trabalhadores, ainda decretam falência para se esquivarem de pagar salários, recisão de contrato etc.
Desde o primeiro dia, a LER-QI, a corrente Metroviários pela Base e a Juventude às Ruas foram prestar apoio ativo à luta dos trabalhadores da Façon, sendo consequente com o programa revolucionário de unidade da classe trabalhadora, de aliança operário-estudantil e com a estratégia de se ligar aos setores mais explorados e oprimidos da classe, que são aqueles que estarão na linha de frente da luta revolucionária, pois como disse Marx "nada tem a perder senão seus grilhões". Foi buscando fortalecer esta aliança que levamos um dos companheiros em greve à plenária da juventude, para que contasse sobre sua luta. É também com este espírito que temos acompanhado de perto esta luta, pensando em como, com nossas modestas forças, podemos contribuir para que triunfe.
O Sindicato dos Metroviários, hoje dirigido por PSOL, PSTU e independentes, também compareceu à greve. A princípio tímido, temeroso de causar "conflitos" com a direção do sindicato "oficial" dos trabalhadores da Façon (o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, dirigido pela burocracia patronal da Força Sindical, a mais pelega de todas as centrais), o Sindicado dos Metroviários aos poucos ganhou confiança porque os próprios trabalhadores da Façon lhes afiançaram a palavra, colocando de canto os burocratas da Força.
 

Quando estava na assembleia dos trabalhadores da Façon, ouvindo os informes sobre a reunião com a(s) empresa(s), o que mais me espantou, contudo, foi a tremenda cordialidade entre a burocracia da Força Sindical e a direção dos metroviários. A princípio me perguntei: por que um burocrata sindical está sendo tão amável com o Altino, militante do PSTU e presidente do Sindicato dos Metroviários? Ao longo da assembleia, contudo, foi ficando claro: para um desinformado, seria difícil apontar quem era o militante de um partido operário que reivindica a tradição do trotskismo, e o burocrata vendido de uma central sindical atrelada desde sua origem aos interesses patronais. O discurso deles era extremamente parecido e se focava exclusivamente nas questões legais e nas reuniões com a empresa, dizendo que era necessário seguir na luta mas que deveriam ter paciência, de que precisávamos negociar e ver como conseguir o pagamento dos salários. A única diferença foi que, em determinado momento, Altino abriu a palavra para Marisa, metroviária que é candidata a vereador pelo PSTU, e que travou uma luta pela denúncia do programa Zorra Total em seu quadro que incentiva o assédio sexual às mulheres nos vagões. Mas mesmo isso foi aceito com tranquilidade pelo burocrata: ele disse como era importante que Marisa se elegesse, que ela representava "a vanguarda da classe operária", e era uma lutadora.
A questão é que a forma de atuar nos sindicatos do PSTU gera muito pouco incômodo à burocracia, aliás, pinta-lhe até de democrática por estar tão aberta à oposição. Daí tanta cordialidade. Nestes momentos de luta, fica claríssima a distinção do PSTU entre um discurso vermelho, radical e socialista para seu jornal ou propaganda, e uma prática sindical rotineira e completamente adaptada aos limites da legalidade burguesa nos momentos de conflito. Na luta dos correios, quando a burocracia do PCdoB/CTB acabou com a greve de forma vergonhosa, a oposição do PSTU, que tem bastante peso, sequer abriu a boca para se pronunciar. Mais uma greve de calendário, para cumprir tabela...
Na sua intervenção na assembleia dos trabalhadores da Façon não havia nenhum incentivo à auto-organização dos trabalhadores, a medidas para conseguir apoio democrático e discutir com a população e outras categorias, a discutir a necessidade de efetivação dos terceirizados, à necessidade de unificação da classe, a discutir o avanço da crise e a necessidade de preparar os trabalhadores para novos ataques da burguesia. Mas não sejamos injustos: Altino convocou os trabalhadores da Façon para que comparecessem ao ato dos trabalhadores efetivos do metrô pela bandeira de aumento na PR. Na prática, o PSTU tem levado os setores mais precarizados e explorados para apoiar a luta dos setores com mais direitos, mais estabilidade e mais tendência à acomodação; um sindicalismo classista e combativo deveria travar a luta pelo oposto, colocando a estrutura do sindicato a lutar com vigor para que a categoria encampasse as bandeiras dos terceirizados, por sua efetivação! Mas, se sequer na linha amarela, os terceirizados mais próximos dos metroviários efetivos, esta luta é levada a sério, que dirá na luta dos "quarteirizados" da Façon! A luta ali se dá com o apoio formal e sentando com o ministério do trabalho para negociar as reivindicações...
Quanta diferença da luta dos terceirizados da União, em que o Sintusp (fundamentalmente a partir de sua ala trotskista de militantes da LER-QI) atuou ativamente não apenas para apoiar os trabalhadores em suas medidas de luta, como o piquete à reitoria da USP, mas também para incentivar sua auto-organização através da democracia operária, com assembleias, comissões etc. Buscando apoio dos estudantes nos cursos da USP, que foram fundamentais para a conquista dos salários; levando a discussão da necessidade de incorporação de todos os terceirizados sem concurso público; organizando com eles o bloco José Ferreira (em homenagem a um jovem trabalhador morto pelas condições de trabalho na Faculdade de Medicina) para participar do primeiro de maio na praça da Sé. Um sindicato como o dos metroviários, muito maior e num setor muito mais estratégico para o capital, teria condições de apoiar de formas muito mais efetivas.
É necessário que a partir destes exemplos os revolucionários avancem no debate em torno de suas práticas, táticas e estratégia para nos armarmos para a luta de classes e para os grandes conflitos que estão por vir. É preciso que lutemos por um sindicalismo revolucionário, para forjar o melhor da vanguarda de nossa classe em cada greve que, como disse Lenin, são nossas "escolas de guerra".

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