Não chego
A tocar, a sentir
Um raio tênue que seja, de luz ou calor
A dissipar esse inverno, essa dor
Que estira meus músculos. Tesos, cansados
A fatiga de gritar contra o vento, a nevasca
Entra gélida pela minha garganta, corta minha voz, meus
pedidos
Que jamais foram ouvidos. Teus ouvidos surdos, incapazes de
saber
Que onde há uma voz que grita por teu nome, há também um
clamor de vida
Uma busca incessante por regurgitar todo esse ódio do mundo,
essa grossa e espessa baba
Que nos cobre de nojo, de ódio, de tédio e indiferença. Toda
essa merda que você permitiu que tomasse seu coração, que tomasse seu cérebro e
te fizesse uma imbecil como tudo aquilo que você jurou combater.
Olho nos teus olhos, pela minha memória, e já não mais te
vejo. Alguma vez te conheci, ou você sempre esteve enfiada nessa montanha de
lixo que a gente é obrigado a chamar de vida, mesmo sabendo que não é, mesmo
sabendo que é a morte que se arrasta por nós, que se arrasta incessantemente
pelos anos sofridos que comem e roem cada fio de esperança.
Você já soube alguma vez que no teu espelho se reflete esse
monstro? Esse, que você vê lá fora e em mim, mas que nunca, jamais viu que está
em você, que está em tudo que toca, que cheira, que sente.
Em tudo que pulsa e que há de morrer. Não, ninguém está
impune. Nem eu nem você.
A diferença é que minha morte, minha dor, eu aprendi a
dividir, a sentir com o outro, a aplacar meus julgamentos que já há muito tempo
não considero impenetráveis, irredutíveis, irrefreáveis.
É essa vulnerabilidade e a consciência dessa dor, da imensa
falibilidade de nossos sentidos, de nosso julgamento e de nossas tentativas. É
a possibilidade de dividir isso com outras criaturas falhas e imperfeitas, sem
ser dominado pelo ódio e pela alteridade impenetrável. É essa, essa pequena
brecha de nossa solidão tão abrangente e que a tudo cobre, é o que chamamos de amor.
E foi apenas isso que quis te ofertar. Mas a porta estava
fechada, e sempre estará.
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