terça-feira, setembro 11, 2012

5 meses: você é minha dor

Foram 5 meses desde sua morte. Nos dois anos que estivémos juntos, ficamos no máximo um mês sem nos ver. Resolvi hoje escrever como se fosse para você, ainda que nunca vá ler minhas palavras. Já pensei muitas vezes sobre o conforto das pesssoas que acreditam em qualquer tipo de sobrevivência, se eu seria mais feliz com esta ilusão. Acho que as pessoas precisam de conforto, sim, todas elas. Mas esta possibilidade de acreditar na sua existência simplesmente não existe para mim; até me sinto meio idiota escrevendo para "você". Isso não significa que eu não tenha algo para me apegar, para me confortar da terrível perda. Já sabe: é pensar que a sua breve vida e a minha estão a serviço de algo maior; que um dia a humanidade vai sair de sua pré-história, e que sua morte e sua vida não terão sido em vão.
Acho que nestes cinco meses a grande questão tem sido entender sua morte. Não no sentido mais, digamos, "simples", de pensar porque você resolveu acabar com sua vida. Isso não é tão misterioso para mim, ainda que as causas do seu sofrimento sejam (como até para você). Entender sua morte é fazer com que ela faça um sentido maior, se encaixe em algum lugar minimamente aceitável para tornar a perspectiva de nunca mais te ver menos insuportável. 
Há duas partes nisso, acho: é possível encontrar um lugar para a sua morte. Mas isso não faz dela algo simples ou confortável. A dor, como eu já entendi há algum tempo, permanece. Entender a sua morte é entender como esta dor vai fazer parte da minha vida daqui pra frente.
A dor muda, tem vários lados, várias formas. Ainda é muito difícil para mim, mas espero que um dia consiga, lembrar de você e me alegrar. Ficar feliz de poder ter compartilhado o tempo que tivemos juntos. Ainda não sou capaz; sua lembrança é terrivelmente dolorosa, ela me lembra da sua ausência com muita intensidade. Mas já há algo que sou capaz de fazer e que antes era apenas uma vontade: transformar esta dor em motivação. Sentí-la como minha própria ferida do que é o capital e a sociedade em que vivemos.
Nunca pretendi, e aliás sempre combati, aqueles que viram na sua morte uma expressão crua e mecânica da torpeza do capitalismo; é reduzir demais a sua dor, não entender suas múltiplas causas e determinações. Mas também é impossível entendê-la sem ver a podridão deste mundo. E sem pensar que se as coisas fossem outras, poderíamos ter te ajudado muito mais.
Há algumas pessoas, tão longe, que tem me ajudado a entender o lugar disso: Tala e Natalia. Me surpreendeu a falta que elas sentem de você. São pessoas que carregarão, como eu, sua memória a cada dia. Que sentem sua falta a cada dia, ainda que há muitos anos não pudessem mais conviver com você. Não é à toa. São pessoas que conviveram com você ali onde era mais árduo; que acharam em você a possibilidade de um outro mundo, uma outra vida, de gente que não era como aquela expressão mais profunda da degradação moral e humana que o capitalismo impõe às classes dominantes também. Você é um símbolo, que elas vão carregar pra sempre. Você é uma esperança, que vive para além de si mesma.
Para mim também: foi, é e será uma dor e uma esperança. A dor de ainda viver em um mundo tão torpe; a esperança e a motivação para seguir lutando e mudá-lo. Sei que você viu em mim também a motivação para lutar, que viu em mim a possibilidade de mudar coisas que te incomodavam até mesmo entre camaradas. Que apostava em mim. E eu vou dar o melhor de mim para honrar sua memória, que é também a memória de tantas e tantos que tombaram em combate.
Eu te amo, para sempre. Aos cinco meses, carrego sua dor comigo todos os dias; mas também sua esperança. Elas nunca vão me abandonar.

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